Meia hora depois entrava Eduardo à porta de Almeida. Viu tudo fechado; correu-lhe um calafrio por todo o corpo. Será tarde? perguntava ele. Vacilou; entraria ou não? Se entrasse e achasse tudo perdido? Enfim, fazendo um esforço, Eduardo passou o portão que se achava perto. Atravessou a alameda das roseiras, onde pela primeira vez falara de amor à pobre Sara. O remorso começou então a aguilhoá-lo. Aquele silêncio, aquele ar fúnebre, que a casa e o jardim respiravam, incutiam-lhe certo terror. Chegou à porta e bateu.

Veio abri-la o pai de Sara.

— Sara? perguntou ele.

— Sara morreu!

O moço tornou-se lívido. Sentiu uma vertigem; os olhos se lhe escureceram, ia cair. Segurou-se a uma cadeira.


O pai de Sara olhava fixo para Eduardo. Este não podia suportar-lhe o olhar, e baixava os olhos. Naquele momento, o pai de Sara era o remorso vivo.

Depois de um pequeno silêncio, Almeida falou:

— Era inútil tê-la salvado do mar há quatro meses, para matá-la agora. Se tal devia ser o desenlace destas coisas, melhor fora que a minha pobre filha tivesse sucumbido à primeira vez; iria assim para o outro mundo sem conhecer as misérias deste...

— Oh! basta! interrompeu Eduardo. Sei quanto sou culpado, não aumente a minha angústia com as suas exprobrações, aliás justas.

O velho sorriu-se tristemente, como quem ouvia duvidoso as palavras do outro.

Depois:

— Vem dar-me os pêsames, não é? continuou ele; muito obrigado. E foi sentar se no sofá, derramando silenciosas lágrimas.

Eduardo esteve alguns momentos contemplando aquela dor muda e respeitável. Depois, dirigiu os olhos para a porta do quarto mortuário. Ouviu que partiam de dentro soluços abafados. Dirigiu-se para a porta.

Maria Luiza, ajoelhada aos pés da cama, contemplava, chorando, o cadáver de Sara. A morta parecia sorrir ainda: dissera-se que sonhava um sonho cor-de-rosa.

Eduardo sentiu rebentarem-lhe dos olhos as lágrimas. Ajoelhou-se silenciosamente ao pé da porta e olhou para Maria Luiza.

Não lhe viu o rosto, mas conheceu-a.

Durou muitos minutos esta cena muda. Finalmente, Eduardo levantou-se e dirigiu-se para o leito da finada. Aí, com os olhos rasos de lágrimas, disse para o cadáver:

— Perdoa-me! Adeus!

E saiu da casa, louco, desesperado.