Banhado, barbeado, meio vestido, Palha lia os jornais, à espera do almoço, quando viu entrar a mulher no gabinete, um tanto pálida.
— Estás pior?
Sofia respondeu com um gesto dos lábios, que tanto negava como afirmava. Palha acreditou que, pelo dia adiante, passaria o incômodo; a agitação da véspera, o jantar tarde... Depois, pediu que lhe deixasse acabar de ler um artigo relativo a certo negócio da praça. Era uma briga entre dois comerciantes, a propósito de uns saques; na véspera escrevera um deles, hoje vinha a resposta do outro. Resposta completa, disse ele acabando a leitura; e explicou longamente à mulher a questão dos saques, o mecanismo da operação, a situação dos dois adversários, os boatos da praça, tudo com o vocabulário técnico. Sofia ouvia e suspirava; mas para o despotismo da profissão não há suspiros de mulher, nem cortesia de homem. Felizmente, o almoço estava na mesa.
Ficando só, a nossa amiga, que apenas tomou um caldo, lá para as duas horas, foi sentar-se à porta de casa, no jardim. Naturalmente, voltou a pensar no lance da véspera. Não estava bem em si nem fora de si, nem com Deus nem com o diabo. Arrependia-se de haver contado o episódio ao marido, e ao mesmo tempo irritava-se com as tentativas de explicação que este lhe deu. No meio das reflexões, ouviu distintamente as palavras do major: "Olá! estão apreciando a lua?" como se as folhas as tivessem guardado, e repetido agora que a aragem começava a movê-las. Sofia teve um calafrio. Siqueira era indiscreto, — indiscreto em farejar e indagar dos negócios alheios; sê-lo-ia ao ponto de publicá-los? Sofia considerava-se já objeto de suspeita ou de calúnia. Formava planos. Não visitaria ninguém; ou iria para fora, para Nova Friburgo ou mais longe. A exigência do marido em receber o Rubião, como dantes, era excessiva; maiormente pela causa dada. Não querendo obedecer nem desobedecer, cuidava em deixar a cidade, pretextando o que quer que fosse.
— A culpa foi minha! suspirou ela consigo.
A culpa eram as atenções especiais com o homem, carinhos, lembranças, obséquios famílias, e na véspera, aqueles olhos tão longamente pregados nele. Se não fosse isso... Ia-se assim perdendo em reflexões multiplicadas. Tudo a aborrecia, plantas, móveis, uma cigarra que cantava, um rumor de vozes, na rua, outro de pratos, em casa, o andar das escravas, e até um pobre preto velho que, em frente à casa dela, trepava com dificuldade um pedaço de morro. As cautelas do preto buliam-lhe com os nervos.