De noite mui linda
Tu queres Arminda
Que lembre-te ainda
Um sonho d’amor?
Attende bondosa,
Com alma piedosa
A chamma vap’rosa
Do teu Trovador.
Nos Ceus esmaltadas
De brilho fadadas —
D’encantos rodeadas
Se viam lusir —
Estrellas mimosas —
Mui bellas, — vaidosas —
Tão magas — radiosas —
De casto sorrir!
Mais longe distante,
Tambem radiante
Se via brilhante
A Lua a fulgir; —
E os mares bramindo
Dos ventos fugindo —
Estava eu sentindo
Seu forte rugir!
Na pôpa assentado
De um barco açodado
Por ventos soprado
Me puz a pensar
Na vida sonhada
Qu’eu tive passada
Comtigo gosada
De mago scismar!
Ás vezes eu cria
Com forte magia
Que só eu te via
Comigo a folgar —
Ás vezes pensando
Que ouvia-te arfando
Teu seio tão brando
No meu a poisar!
Então extasiado
Do mundo olvidado
Comtigo abraçado
Me puz a beijar
Teus labios mimosos,
Teus olhos fermosos —
Que vinham ferv’rosos
A mente escaldar!
E em fogo divino
Mui casto e mui dino
Vagava sem tino
Em dôce candôr
Ao teu abraçado
Não sei se acordado
Meu corpo extasiado
Nos sonhos d’amor!
Depois dispertando
Meus olhos fitando
Te estava mirando
No teu dormitar —
Como eras formosa!
Quanto eras mimosa,
Arminda ditosa
No teu respirar!
Travando da lyra
Que tanto m’inspira
Nos sons que delira
Me puz a trovar —
Cantei o teu rosto —
Divino composto —
A mim só exposto
Que o sei adorar!
Por cum’lo d’anhélos
Teus bellos cabellos
Da côr dos meus zèlos
Me puz a affagar: —
Mas eis que disperto
E vejo-me — é certo —
Já ter descuberto
Que é tudo um sonhar!
Eu vi-te! — E acordado
O sonho gosado
Agora lembrado
Não posso esquecer!
Fugio-me a ventura
Tão maga e tão pura —
Se o sonho não dura
Porque hei de viver?! —