MOTE
Tenho um galante chinelo
Com que vou a São Mateus,
Tenho minha fralda rota,
Ninguém me bote quebranto.


GLOSA


Se vós tendes um baiju
Com seus babados de chita,
Eu tenho agora a marmita,
Semi-rubra de ourocu.
Se tendes de gorgutu
Um macaquinho amarelo,
Eu nas casas do castelo,
Como é público e notório,
Por baixo do consistório
Tenho um galante chinelo.

Se vós tendes de cambraia
Camisa fina e bordada,
Eu tenho minha rendada
Que veio da Marambaia:
Se de cetim tendes saia,
Eu só tenho os cações meus;
Se com estes trastes teus
De mim todas te desunes,
Eu tenho os panos de Tunes,
Com que vou a São Mateus.

Se tendes sapato justo,
E pões as mãos nas ilhargas,
Eu tenho as botas mui largas,
Com que passeio sem custo.
Se tendes de raios susto
Eu caço da vela a escota;
Se tendes no frasco a gota
Como mostra das crioulas,
Eu por baixo das ceroulas
Tenho a minha fralda rota.

Se tendes novo capote
Mais chibante do que o velho,
Eu tenho um torto chavelho,
Que me faz vezes de pote.
Se a cavalo andais de trote,
Eu do chão não me levanto,
Não me assusto, nem me espanto,
Serei sempre pé-de-boi,
Ora aí está como foi,
Ninguém me bote quebranto.