1Tratam de diminuir
o dinheiro a meu pesar,
que para a cousa baixar
o melhor meio é subir:
quem via tão alto ir,
como eu vi ir a moeda,
lhe prognosticou a queda,
como eu lha prognostiquei:
dizem, que o mandou El-Rei,
quer creiais, quer não creiais.
Não vos espanteis, que inda lá vem mais.
  
2Manda-o a força do fado,
por ser justo, que o dinheiro
baixe a seu valor primeiro
depois de tão levantado:
o que se vir sublimado
por ter mais quatro mangavas,
hão de pesá-lo as oitavas,
e por leve hão de enjeitá-lo:
e se com todo este abalo
por descontentes vos dais,
Não vos espanteis, que inda lá vem mais.
  
3As pessoas, que quem rezo,
hão de ser como o ferrolho,
val pouco tomado a olho,
val menos tomado a peso:
os que prezo, e que desprezo
todos serão de uma casta,
e só moços de canastra
entre veras, e entre chanças
com pesos, e com balanças
vão a justiçar os mais:
Não vos espanteis, que inda lá vem mais.
  
4Porque como em Maranhão
mandam novelos à praça,
assim vós por esta traça
mandareis o algodão:
haverá permutação,
como ao princípio das gentes,
e todos os contraentes
trocarão droga por droga,
pão por sal, lenha por soga,
vinhas por canaviais:
Não vos espanteis, que inda lá vem mais.
  
5Virá a frota para o ano,
e que leve vós agouro
senão tudo a peso de ouro,
a peso tudo de engano:
não é o valor desumano,
que a cada oitava se dá
da prata, que corre cá,
pelo meu fraco conceito,
mas ao cobrar fiel direito,
e oblíquo, quando pagais;
Não vos espanteis, que inda lá vem mais.
  
6Bem merece esta cidade
esta aflição, que a assalta,
pois os dinheiros exalta
sem real autoridade:
eu se hei de falar verdade,
o agressor do delito
devia ser só o aflito:
mas estão tão descansados,
talvez que sejam chamados
nesta frota, que esperais;
Não vos espanteis, que inda lá vem mais.