Turba esfaimada, multidão canina,
Corja, que tem Deus ou Momo, ou Baccho,
Reina, e decreta nos covis de Caco
Ignorancia d′aqui, d′alli rapina:
Colhe de alto systema e lei divina
Imaginario jus, com que encha o sacco;
Textos gagueja em vão Doutor macaco
Por ouro, que promette alma sovina:
Circulo umbroso de venaes pedantes.
Com torpe astucia de maligno zorra
Usurpa nome excelso, e graus flamantes:
Ora mijei na sucia, inda que eu morra
Corno, arrocho, bambu nos elephantes,
Cujo vulto é de anões, a tromba é porra!
Notas
editarA respeito da origem d′este soneto contou-se-nos que tendo Bocage sido iniciado em uma das LL.*. Maçonicas que n′aquella epocha existiam em Lisboa (de que era Ven.*. Bento Pereira do Carmo, e Orad.*. José Joaquim Ferreira de Moura, ambos deputados ás Côrtes de 1821 e 1823, e bem conhecidos na historia politica dos nossos tempos modernos) frequentára durante alguns mezes aquella associação, assistindo ás suas reuniões, até que desavindo-se um dia com os Ir.*. por qualquer motivo que fosse, em um accesso de cholera rompera extemporaneamente n′este soneto, que rasgou depois de escripto; mas alguem o tinha já copiado, aliás succeder-lhe-ia o mesmo que a tantas outras producções do auctor, irremediavelmente perdidas.
Doctor macaco — José Joaquim Ferreira de Moura tinha eflfectivamente uma physionomia amacacada como ainda se mostra do seu retrato, e gaguejava algum tanto, segundo dizem os que o conheceram.
[Nota de Inocêncio Francisco da Silva.]
- ↑ MATTOSO, Glauco. Bocage, o desboccado; Bocage, o desbancado. São Paulo: 2002. Disponível em <http://www.elsonfroes.com.br/bocage.htm. Acesso em: 28 maio 2014.