(Original)
Vida da minh'alma,
Não vos posso ver;
Isto não é vida,
Hei-me de perder.

Não pode a vontade
Onde vive amor,
Esconder saudade,
Nem encobrir dor.
Não há mal maior,
Nem há mais morrer,
Que ver-me com vida,
Sem vos poder ver.

Neste bem que quero
N'alma e no desejo,
Vivo do que espero,
Mouro do que vejo.
Faz-me a vida pejo,
Pois não posso ver,
Quem me tem a vida,
E sempre há de ter.

(no Cancioneiro de Paris)
Vida da minha alma,
Não vos posso ver;
Isto não é vida,
Hei-me de perder.

Dês que fui ausente
Donde vós estais,
Nunca vivi mais,
Um dia contente.
Sou tão diferente,
Do que soía a ser,
Isto não é vida,
Hei-me de perder.

Dês que vos vi vida
Nunca mais a tive,
Minha pena vive,
Minha dor crescida.
Já tenho perdida,
Esperança de viver,
Isto não é vida,
Hei-me de perder.

Não me dá coitado
Cuidado lugar,
Que possa cuidar,
Em outro cuidado.
Pois deste apartado,
Já não pode ser,
Isto não é vida,
Hei-me de perder.

De mim inimigo
É o meu desejo,
Que quando vos vejo,
Vejo meu perigo.
Tomasse comigo,
Não me val dizer,
Isto não é vida,
Hei-me de perder.

Hei-me de perder
Porque vos não vejo,
Que com tal desejo,
Mal posso viver.
Poder cá dizer,
Que perdi a vida,
E bem mal perdida,
Pois é sem vos ver.

Não pode a vontade
Onde vive amor,
Esconder saudade,
Nem encobrir dor.
Não há mal pior,
Nem há mais morrer,
Que ver-me com vida,
Sem vos poder ver.

Neste bem que quero
N'alma e no desejo,
Vivo do que espero,
Mouro do que vejo.
Cuidado sobejo,
Me tem sem vos ver,
Com mais triste vida,
Que vendo-a perder.

Sempre desejei
De muito perdido,
Ter-vos escondido,
O mal que busquei.
Faziam minh'alma,
Por vos poder ver,
Tem dele sabido,
Hei-me de perder.

Mouro por vos ver
E se este desejo,
De tão longe vejo,
Que posso querer.
Quero não viver,
Quero não ter vida,
Quero-a perdida,
Quero-me perder.