Uma manhã, inesperadamente, Crebillon surgiu com a chave da casa que encontrara e, como os rapazes ainda rolavam na cama, pensando no carinho desigual com que o bom Deus distingue os seus filhos na terra, dando a uns milheiros de apólices e a outros esquecendo em miséria, o futuro presidente, já com os ares despóticos de um Rosas, manifestou-se em palavras duras contra a preguiça, mãe de todos os vícios.

Os rapazes ouviram calados. Desceram ao Cranium e, depois de rápida fricção, galgaram os degraus, vestiram-se à pressa e saíram levando, como lacaio, o resignado João de Deus, que os não deixava senão à hora das refeições, porque não se podia habituar com os apertados jejuns, embora soubesse que eram garantia de bem-aventurança.

Crebillon, caminhando para o bonde, falava das suas constantes idas e vindas pelo Catete à procura de um prédio que reunisse as condições indispensáveis a uma república modelo, como a de Platão, até que lhe indicaram essa esplêndida vivenda principesca de onde havia saído, dias antes, um barão, homem de gosto e fortuna.

Toledo, curioso, pediu informações sobre a casa que iam habitar, mas o intrépido abolicionista rosnou ufano, torcendo a pêra flamínia, com sorriso vaidoso:

— Só te digo que é um palácio!

Era na rua de Santa Cristina. Quando Crebillon parou diante da casa de aspecto nobre — seis janelas de frente em cada pavimento, abrindo, as do superior, para uma sacada corrida de complicado gradil dourado, os rapazes, boquiabertos, pasmados, tiveram a mesma significativa exclamação surdamente murmurada e João de Deus sorriu, afagando o ventre sumido.

A porta, que parecia de bronze e pesada como o glorioso metal das imortalizações, girou docemente e o vestíbulo apareceu deslumbrante. Era de pequenos ladrilhos de mármore, em estrelas. As paredes, alvas, tinham enrediças de ramos, corimbos florentes finamente pintados e dois medalhões nos quais, sem demora, Ruy Vaz percebeu uma entrada da barra do Rio de Janeiro e uma vista do Reno romântico, castelos e vinhas e um rebanho com o seu pastor à sombra de ruínas negras. E soltos, voando na alvura lisa e luzida, pássaros de cores variegadas.

Acima da padieira da porta envidraçada dois velhos de imensas barbas derramadas, nus, as pernas estiradas, encostados a ânforas que jorravam para um lado e outro golfões de água espumante. Eram dois rios mitológicos. Ruy Vaz apenas achou defeito no ventre de um dos patriarcas fluviais. Realmente era desmedido, e se não fossem as barbas copiosas da figura, bastava aquela monstruosa pança para designar-lhe o sexo. Mas Anselmo achou natural:

— Um rio deve ter barriga d'água.

Crebillon achou o "rio" indecoroso. O pintor, ao menos por decência, devia ter espalhado juncais que ocultassem aquela deformidade. Passaram adiante ganhando o corredor, onde a luz era escassa, e só viam portas abrindo para gabinetes e alcovas, mas, alcançando a sala de jantar, ficaram deslumbrados. Era imensa! Quatro janelas olhavam para o jardim, folhagens balouçavam-se, inclinando-se indiscretamente como se quisessem penetrar aquela basílica de regalo, aquele santuário do ventre, onde podia, à vontade, ser servido um banquete a cem pessoas em mesa extensa, florida e rútila de baixelas.

O teto era de madeira fosca, com entalhes preciosos. As paredes pintadas: eram aves, enfiadas de peixes, lebres e pacas sangrando, pencas de frutas, racimos e açafates de flores sobre as quais pairavam borboletas.

O soalho era de mosaico de madeira e, encravado na parede, com uma carranca feroz de bochechas cheias como um Euro, havia um lavabo de mármore.

O ar que bafejava a sala, cheirava suavemente a jasmim.

— Aqui pode a gente comer! — exclamou Anselmo. As próprias paredes encarregam-se de despertar o apetite. Que delícia e que aroma!

Crebillon avançou solene, mostrando com a bengala o grande braço do gás, com oito açucenas azuis.

— Isto é que não vai bem aqui; e ajuntou: A casa é boa, ainda assim precisa de certos retoques artísticos. Este gás, por exemplo, vai fora. Esta sala está a pedir um lustre para vinte ou trinta velas; vinte chegam, aqui ao centro. Agora vejam lá vocês se concordam: A mobília de canela ou de imbuia...

— Por que não há de ser de carvalho? — emendou Ruy Vaz.

— Aí vem você com o carvalho! Para que havemos de recorrer ao estrangeiro quando temos as mais belas madeiras do mundo? Que diabo! Vocês não são patriotas... É por estas e outras que nunca seremos autônomos, havemos de ser sempre um protetorado europeu. Carvalho... Não senhor: canela ou imbuia, estilo grego. Ou monta-se a casa com gosto ou então...

— Pois seja, concordou Ruy Vaz.

— Imbuia ou canela, continuou Crebillon. Aqui, o bufê... Ali, o guarda-prata... Acolá, os trinchantes. Duas dúzias de cadeiras... Que acham?

— Sim, duas dúzias, concordou Anselmo.

— Nos cantos podem ficar uns cache— pots com palmeiras, dracenas. Eu detesto o encerado inglês, mas se vocês fazem questão...?

— Não, dispensa-se o encerado. Com um soalho como este é até profanação.

— Também acho. Então está pronta a sala de jantar. Ah! Sim, precisamos escolher uns panos claros para as janelas e portas. Isso vê-se depois. Vamos adiante.

Passaram à copa ladrilhada. Era vasta, com um armário e duas pias de mármore.

A cozinha lembrava a de um castelo feudal. No forno do fogão, novo e brunido, com os metais muito reluzentes, caberia um novilho inteiro. Era uma peça solene, digna de um comentário, com uma complicada rede de tubos amarelos e torneiras, bocas de todos os tamanhos, caldeiras, uma infinidade de minúcias que só poderiam ser entendidas por um mestre perito que, a ciência rara de queimar uma omelette au rhum, reunisse a sabedoria de mecânico.

João de Deus, depois de examinar detidamente o monstro, passeando em torno dele, abrindo e fechando torneiras, escancarando pesadíssimas portas que davam aos olhos a vertigem do abismo, confessou que não entendia "aquela geringonça". Mas Crebillon, sempre austero, avançou para mostrar ao negro como se operava. Olhou, deu volta e, de repente, lembrando-se de alguma coisa, saiu em passos ligeiros. Tornou, porém, logo depois e, abrindo, com muita convicção, uma torneira recuou encharcado e, certamente, a casa teria sido inundada se João de Deus, afrontando o esguicho, com risco de apanhar uma bronquite, não houvesse estancado o jorro.

De novo Crebillon investiu e foi distorcendo todos os registros que encontrou e, logo, um cheiro ativo de gás espalhou-se pela casa. Crebillon riscou um fósforo, atirou-o ao tubo, deu um pelo prudente e houve a explosão. O monstro ficou iluminado como um edifício público em dia de festa nacional. Os rapazes aplaudiram com entusiasmo e João de Deus, aterrado, recuou do fogão como de coisa satânica.

— Vêem vocês? Temos aqui o gás, que é a essência do coke. Não precisamos de carvão nem de lenha. Podemos cozinhar um boi com a maior brevidade e limpamente.

Deixaram o monstro, menos João de Deus que ficou encarregado de fechar os registros, e passaram a examinar a cozinha, também ladrilhada até meia parede. Duas grandes pias defrontavam-se.

— Aqui tem os seus domínios, mestre João de Deus, disse Crebillon. O negro ouvia comovido, de olhos baixos. Você tem boné e avental?

— Não, senhor.

— Pois é preciso mandar fazer.

— Certamente, concordaram unânimes os do segundo andar.

— Isto não é cozinha para mangas de camisa. E é preciso trazê-la sempre muito asseada, entendeu?

— Sim, senhor.

— Bem. Vamos agora ver o banheiro, meus amigos. Vocês vão ver! Eu acho perigoso...

— Perigoso!? — exclamou Anselmo.

— Sim, isto é: não para mim, porque sei nadar.

— Também eu, disse Anselmo.

— E eu, ajuntou Toledo.

— Mas tu não sabes, Ruy Vaz?

— Eu? Não sei.

— Pois meu caro, aceita o meu conselho: não entres no banheiro sem salva-vidas — é como a bacia do Prata, meu amigo, vais ver. Vamos.

Seguiram e João de Deus, já exausto, continuava a torcer os registros. do fogão monstruoso.

Impressionados pelas palavras de Crebillon, os rapazes atravessaram um estreito paço de mármore alguergado e pararam diante de uma porta branca.

— É aqui! — disse Crebillon, com profundo respeito e, lentamente, foi impelindo a porta como se quisesse dar, aos poucos, a impressão magnífica da maravilha. Os rapazes invadiram o recinto e houve um significativo silêncio.

Também de mármore enxadrezado era todo o piso e o vasto aquário, largo e profundo, com uma calha à altura de dois metros, duas torneiras de cobre e a rosácea imensa, no teto de ripas embrechadas. Duas maçanetas de louça matizada giravam na parede marmórea para a distribuição das águas altas. Três janelas, com persianas, coavam uma luz serena e o frescor das lajes e das águas ocultas espalhavam-se no ambiente, dando uma sensação regalada de inverno.

Tudo era branco e o asseio casava-se com o conforto. A beleza era geral, não havia que criticar. Os cabides, de nítido metal, reluziam e, a um canto, fechada, uma caixa lustrosa de quando em quando interrompia o silêncio com um burburinho.

Crebillon quis mostrar a perfeição daquela utilíssima dependência, mas para que não lhe sucedesse sair, como da cozinha, com as roupas encharcadas, bradou pelo africano que acudiu à pressa parando à porta, fascinado pelo fulgor dos muros alvos.

— João de Deus, distorce-me uma daquelas bolas... Mas toma cuidado com a água que vem por ai abaixo.

O negro, alongando o braço com grande medo, pôs-se a torcer a maçaneta. Houve um ronco estupendo, um ronco de tromba em mares largos e logo, da altíssima calha, um gorgolão de água despenhou-se impetuosamente, espalhando uma névoa sutil. Crebillon, apesar da voz formidável que o distinguia, valendo-lhe a antonomásia de Stentor, teve de bradar para que fosse ouvido, tão fragoroso era o rolar das águas soltas pela beiçorra da calha, caindo estrondosamente nas lajes.

— Vêem vocês? Parece Paulo Afonso. E os três concordaram assombrados. Agora a outra, João.

O negro, aterrado, deu volta à outra maçaneta e foi um desabar de chuva como no dilúvio.

A mania das águas alucinava o abolicionista que entrou a urrar, sapateando, brandindo a bengala:

— Abre agora as torneiras, João!... As torneiras!

Mas o negro não ouvia, via apenas a boca imensa, o ar furibundo e os gestos desabalados de Crebillon. Aproximou-se curvado e o abolicionista bramiu:

— Abre as torneiras, com todos os diabos!

E quando, por todos os vasadouros, a água volumosa, correu inundando o aquário, Crebillon pôs-se a afagar a pêra e parecia o próprio Deus olhando satisfeito e vingado a queda dos golfões tremendos que alhanaram o mundo, com remissão apenas da família do patriarca e das espécies recolhidas na arca.

O aquário transbordava quando Crebillon avançou muito grave e deu um safanão à corrente do escoadouro enquanto João, de olhos apertados, ia fechando as torneiras e torcendo as maçanetas. Ficaram apenas gotas lentejando e as águas, como depois de aplacada a cólera do Altíssimo no cataclismo universal, começaram a baixar afunilando-se à altura da válvula. Houve um sorvo por fim e o banheiro ficou, de novo, vazio e resplandecente, extasiando o grupo.

— Então!? — indagou o presidente encarando os rapazes.

— É uma delicia! Sim, senhor!

— Não há melhor no Rio, afirmo! E todos menearam a cabeça, concordando. Vamos agora ao jardim.

Desceram por uma escada de granito e, chegando ao ar livre, à claridade límpida do sol, que luzia quente, lançaram os olhos pelos canteiros relvados, de graciosas formas geométricas sobre o saibro branco e rútilo das aléias.

Eram inúmeras as roseiras encostadas a espeques, filas de caladios diversos, begônias, cravos, magnólias, gardênias, dálias, uma araucária esguia, várias palmeiras ornamentais e quatro figuras de louça, sobre pilastras, figurando as estações. A Primavera era uma graciosa e linda rapariga que sorria toucada de flores, pisando flores; o Outono era um ceifeiro moço com uma paveia de trigo aos pés, a foice ao ombro, os olhos no céu, satisfeito e feliz; o Estio era outra donzela, formosa e jocunda, que festejava uma borboleta pousada no seu ombro nu e o Inverno, metido entre árvores, era um velho tristonho, barbado e ferrenho, curvado sobre um cajado, com o gabão muito enrolado em volta do corpo magro e transido.

Sobre as figuras simbólicas as opiniões divergiram: Crebillon gabou-as com entusiasmo, Ruy Vaz achou-as "pulhas". Ao fundo, formando um bosque aceitoso, velhas árvores frondosas faziam sombra a uma barra fixa e a um trapézio.

— Temos aqui a ginástica, a educação física. Ao sair do banho uma flexão, uma sereia, depois o almoço, o trabalho... uma delícia, hem? Isto é sempre melhor do que o pardieiro da rua Formosa, confessem.

— Ora! — exclamaram os três. Contra o muro era o galinheiro, parte coberto, parte ao tempo, cercado de arame, com os poleiros caiados e um tanque para os palmípedes; ao lado a casa do cão coberta de zinco e, bem ao centro do jardim, o aviário de arame em forma graciosa de chalé com o seu repucho que era, ao mesmo tempo, bebedouro. Crebillon, colhendo uma rosa e fincando-a na botoeira, disse, passeando um olhar pelo jardim:

— Isto não dispensa um jardineiro, o João de Deus não pode cuidar ao mesmo tempo do fogão e das flores...

— Naturalmente.

— Não pode, repetiu pensativo. Vou ver um homem que entenda de plantas, até porque pretendo ter as minhas orquídeas e os meus tinhorões de escolha. Não podemos dispensar o jardineiro Vou ver também se arranjo um cão das ilhas, são os melhores para os quintais: não há ladrão que lhes escape. Tive um que, certa noite, tendo um patife penetrado em minha casa, quando foi para saltar o muro, o animal atirou-se-lhe às pernas.

— E matou-o!? — perguntou Anselmo.

— Não, mas pregou-lhe um susto que o desgraçado esteve muito tempo entre a vida e a morte.

— Quem te disse?

— Ninguém, eu imagino. Era um cão! Vou ver se encontro um igual para aqui. Para o galinheiro uma meia dúzia de galinhas de raça, uns gansos de Tolosa ou de Emdben, uns patos mandarins, uns perus. Para o aviário mando vir aves do Norte: mutuns, guarás, garças, jacamins; não, jacamins para o galinheiro. À tarde vem a gente aqui para fora no seu paletó branco saborear o café, ouvindo os gaturamos e as patativas, os gansos, os galos e gozando o perfume das flores. Que tal?

— É magnífico!

— E podem vocês trabalhar à vontade. Aqui nada falta: têm, de um lado Santa Teresa e do outro lado o esplêndido panorama da cidade. Não é aquela rua acanhada e sórdida, com aquele silvar constante de locomotivas e com aquela mulher sempre a resingar e aqueles quintais imundos e aquela gente tresandando a suor e a cachaça, nada disso. Aqui a vizinhança é nobre, gente da élite. Vocês podem julgar pelas casas — e ajuntou com mistério: Já que toquei neste ponto, devo dizer que a moralidade aqui deve ser escrupulosamente observada: nada de escândalos, isto é um bairro de respeito.

— Vê-se logo.

— Bem, vamos agora lá acima.

Tornaram pelo mesmo caminho e, atravessando a sala de jantar e o corredor, subiram por uma larga escada iluminada por uma clarabóia, alcançando o pavimento superior. Não eram quartos, eram salões e todos com janelas. O da frente, que tinha o teto de estuque e dourado, abria para a sacada as suas quatro janelas. O soalho encerado, reluzia. Eram oito quartos, oito imensidades admiráveis e dois salões. Ruy Vaz chegou a aventurar que não seria mau estabelecer-se ali dentro uma linha de bondes para facilidade da comunicação entre os aposentos, um elevador para a ascensão e um telefone para uso interno. Era o infinito. Crebillon, modesto, escolheu o menor quarto, ao fundo, com duas janelas para o jardim e larga vista da montanha e de grande parte da cidade e do mar, muito azul coalhado de barcos, sem falar nos fundos das casas vizinhas: jardins, terraços e janelas que deixavam entrever interiores faustosos — câmaras, gabinetes, salas de jantar. Foi nesse aposento que se decidiu fazer a mudança no dia seguinte, mas logo surgiu uma dificuldade: não havia dinheiro para as carroças.

— Eu mando as andorinhas, disse o generoso Crebillon. Quantas?

— Uma e meia.

— Uma e meia? Duas, homem; duas andorinhas. Que mais?

— Mais nada.

— E vocês já escolheram os aposentos?

— Já. Anselmo e Ruy Vaz haviam tomado, para trabalhar, a sala da frente do pavimento superior e dois quartos incomensuráveis. Toledo ficou com a sala central e um quarto contíguo.

— Mas, com o que temos, esta casa vai ficar como um deserto com pequeninos oásis, disse Ruy Vaz.

— Ó senhores! — exclamou Crebillon, não se incomodem com a casa. Pois eu não disse que vou escolher a mobília? Então! Até não sei se seria melhor que vocês vendessem os cacarecos. Em todo caso eu trato primeiro lá de baixo: sala de visitas, sala de jantar, vestíbulo, os dois quartos, depois subo. Vão ver como isto fica um brinco. Que é do João de Deus? Ó João de Deus!

O discreto africano estava no corredor e tanto que ouviu o berro do abolicionista correu com a toalha inseparável, que era o travesseiro em que repousava a cabeça, a rodilha com que saía ao ganho e o lenço com que enxugava o suor abundante do seu carão de azeviche.

— João, veja hoje mesmo o boné e o avental, porque amanhã começa o seu trabalho. Vou mandar vir a bateria da cozinha e a louça. E olhe lá! Nada de assobios aqui, ouviu?

— Sim, senhor, murmurou o negro, de olhos baixos.

— Estamos então combinados; amanhã, não é verdade?

— Sim, amanhã!

— Mandas as andorinhas? — perguntou Ruy Vaz.

— Está visto: duas?

— Duas.

— E quanto ao senhor João de Deus fica conosco por... Pensou, alisando a pêra, com os olhos nos bicos dos sapatos, erguendo altivamente a cabeça fulva, ajustou: sessenta mil réis, que dizes?

O negro encolheu os ombros e Ruy Vaz, afagando-o, disse:

— É um achado, meu amigo. Nos tempos que correm, sessenta mil réis, casa e comida... uh!

— E podes escolher um quarto lá em baixo, João. Tens um magnífico, perto da sala de jantar. Queres?

O negro sorriu enlevado.

— Bem, estamos tratados. Vamos.

Desceram. Crebillon trancou as portas e ganharam a rua. Havia gente pelas janelas das casas vizinhas e Crebillon, ufano, repetiu, acendendo um charuto:

— Vai ficar um brinco, garanto.

Chegando ao começo da rua de Santo Amaro, despediu-se; "tinha de ir à casa de um velho parente, na Gávea". Os futuros palacianos, sempre seguidos de João de Deus, desceram para a cidade, a pé, sem almoço, sob uma soalheira cáustica.