Era um dia ao anoitecer: D. Inigo estava à mesa, mas não podia cear, que grandes desmaios lhe vinham ao coração. Um pagem muito mimoso e privado, que, em pé diante dele esperava seu mandar, disse então para D. Inigo: "Senhor, por que não comeis?"

"Que hei-de eu comer, Brearte, se meu senhor D. Diogo está cativo de mouros, segundo rezam as cartas que ora dele são vindas?"

"Mas seu resgate não é a vossa mofina: dez mil peões e mil cavaleiros tendes na mesnada de Biscaia: vamos correr terras de mouros: serão os cativos resgate de vosso pai.

"O perro del-rei de Leão fez sua paz com os cães de Toledo e são eles que têm preado meu pai. Os condes e potestades do rei tredo e vil não deixariam passar a boa hoste de Biscaia."

"Quereis vós, senhor, um conselho, e não vos custará nem mealha?"

"Dize, dize lá, Brearte."

"Por que não ides à serra procurar vossa mãe? Segundo ouço contar aos velhos, ela é grande fada."

"Que dizes tu, Brearte? Sabes quem é minha mãe e que casta é de fada?"

"Grandes histórias tenho ouvido do que se passou certa noite neste castelo: éreis vós pequenino, e eu ainda não era nada. Os porquês destas histórias, isso Deus é que os sabe."

"Pois dir-tos-ei eu agora. Chega-te para cá, Brearte."

O pagem olhou de roda de si, quase sem o querer, e chegou-se para seu amo: era a obediência e, ainda mais, certo arrepio de medo que o faziam chegar.

"Vês tu, Brearte, aquela fresta entaipada? Foi por ali que minha mãe fugiu. Como e por que, aposto que já to hão contado?

"Senhor, sim! Levou vossa irmã consigo..."

"Responder só ao que pergunto! Sei isso. Agora cala-te."

O pagem pôs os olhos no chão, de vergonha; que era humildoso e de boa raça.