Personagens: OS MESMOS menos o CRIADO
CAMILO - Vou marcar na minha folhinha este venturoso domingo.
ELVIRA - E o senhor a gracejar em uma situação destas!
CAMILO - O que tem esta situação? Quer que chore? Não estamos um ao lado do outro?
ELVIRA - O coração bem estava me dizendo que eu não devia ir à cidade. Saio de casa a fim de comprar na rua do Ouvidor um presente para dar à mamãe...
CAMILO - E quis a minha boa estrela que seu pai, ao chegar, às três horas da tarde, na rua Gonçalves Dias, no meio da lufa-lufa do povo que ali se apinha à espera de bondes, tomasse o carro do Jardim Botânico pelo das Laranjeiras, que investisse para ele, que Vossa Excelência, mais ligeira, alcançasse um lugar e que ele ficasse na plataforma, sendo daí enxotado pelo urbano, por estar fora da lotação. Nada mais natural. Vossa Excelência não deu por isso; o bonde partiu e eis-me a seu lado, fruindo esta ventura que me esperava. (Vai à janela.)
JOSEFA (Desce.) - Ah! Minha Nossa Senhora das Candeias, que lembrança desgraçada teve aquele homem em querer por força vir visitar hoje a comadre. O senhor não avalia em que assados me vi. Deram-me tamanho futicão no vestido que descoseram-me todo o franzido, perdi o chapéu, romperam-me o chale, estive entalada na porta do carro dois minutos sem poder tomar respiração, puseram-me enfim mais arrepiada do que uma galinha no choco. Sento-me furiosa, parte o bonde e quando procuro pelo Senhor Pimenta...
CAMILO - Tinha ficado também, graças à lotação.
JOSEFA - O senhor não me explicará que história é esta de lotação?
CAMILO - A lotação, minha senhora, é uma medida empregada pela polícia, para que ninguém venha incomodado dentro dos bondes.
JOSEFA - Pois olhe, mais incomodada do que eu vim é impossível! Lá na Meia Pataca não há lotação e a gente anda como quer. Onde está meu marido? O senhor compreende, estou casada com o Pimenta apenas há dois meses...
CAMILO - Devem ter tido uma lua de mel muito ardida.
ELVIRA - Leve-nos para a casa, senhor; iremos com esta senhora e eu explicarei tudo a meu pal.
CAMILO - Tenha paciência; havemos de jantar juntos. Vou chamar o criado e mandar preparar o que houver de mais esquisito. (Canta.)
Bem unidos
Jantaremos,
Quão felizes
Não seremos.
Teu talher
Junto do meu!
O meu rosto
Junto do teu!
Que ventura
Vou gozar!
Que mais posso
Desejar?
ELVIRA -
Minha mãe,
Pobre coitada,
Deve estar
Angustiada.
JOSEFA -
E o Pimenta
Lá ficou,
Sem saber
Aonde estou.
CAMILO -
Não se zangue,
Deixe estar,
Nós havemos
De o encontrar.
ELVIRA - (TODOS)
Minha mãe, etc...
JOSEFA - (TODOS)
E o Pimenta, etc...
CAMILO - (TODOS)
Não se zangue, etc...
CAMILO (Gritando para dentro.) - Garçom! Garçom!
ELVIRA - Vou partir sozinha no primeiro bonde.
CAMILO - Não consinto. (Aparece o criado.) Garçom, prepara naquela sala um jantar para três.
JOSEFA (Para o criado.) - Oh! Seu garçom, o senhor podia me fazer um obséquio? Estou toda descosida, se houvesse lá dentro uma agulha...
CAMILO - Vá com ele, minha senhora, e fale lá dentro com a madama, que há de encontrar tudo quanto precisa. (Saem Josefa e o criado.)