Se o Alexandre se admirara de que o barão de Moreira houvesse comparecido à igreja, mais admirado ficou vendo que o patrão, daquele dia em diante, começou a tratá-lo com uma simpatia e uma atenção que em pouco tempo se transformaram em familiaridade. Chamava-o para o auxiliar em todos os trabalhos do escritório, confiava-lhe serviços de responsabilidade, incumbia-o de receber grandes somas ou levá-las ao banco, e um dia, estando o moço a passar uma carta a limpo, carta confidencial, de muita importância, o patrão ofereceu-lhe um dos seus magníficos havanos, dizendo-lhe:

— Fume, Alexandre.

Motta, o sócio do barão, que era a antítese deste, bonacheirão, amável, amigo dos empregados, estava estupefato e não sabia a que atribuir aquele favoritismo; o guarda-livros, porém, e os outros caixeiros, já enciumados, e talvez instruídos pelas perversas insinuações do linguarudo Pimenta, murmuravam: - Não há nada como ter irmã bonita...

O barão pedia constantemente noticias da família, interessando-se pela viúva, e repetindo, quase todos os dias, o oferecimento dos seus serviços e da sua amizade para prevenir, remover ou sanar qualquer dificuldade criada pelo súbito falecimento do velho Raposo. O rapaz desfazia-se em agradecimentos e, chegando à casa, contava à mãe todas as atenções e finezas que merecia ao patrão.

D. Firmina, perspicaz e manhosa, desconfiou naturalmente que o barão, impressionado pela beleza de Fadinha, procurasse meios e modos de se aproximar da família, e um dia aconselhou o filho a que lhe oferecesse a casa dizendo-lhe que ela, d. Firmina, muito reconhecida a todos os favores do titular, teria muita satisfação em lhos agradecer pessoalmente.

Se d. Firmina bem o disse, Alexandre melhor o fez, e o barão, já se vê, não deixou fugir uma ocasião que havia já dois meses provocava. Um belo domingo resolveu ir almoçar no Engenho Novo. Para dar maior solenidade à visita, d. Firmina foi esperá-lo na estação, acompanhada pelos rapazes, só pelos rapazes, porque Fadinha, sabendo da vinda do barão, fechou-se na alcova, pretextando uma enxaqueca violenta, e não houve súplicas nem ralhos, carinhos nem ameaças que a fizessem sair.

A moça estava desesperada: havia mais de um mês que não punha os olhos no seu querido Remígio. Foram tantas as grosserias de d. Firmina e dos rapazes, que o namorado, compreendendo que o queriam afastar, e vendo que era impossível afrontar a pé firme aquela súcia de ingratos, fez-lhes a vontade, sem, contudo, renunciar os seus projetos de casamento, porque Fadinha continuava a ser a mesma, e ele considerava-a digna, por todos os respeitos, do seu afeto e da sua constância.

— Façam o que fizerem, serei tua, só tua, juro-te por alma de meu pai! Quanto mais me oprimirem, quanto mais te ofenderem, mais crescerá, se é possível, o ardente amor que te consagro! Sou tua noiva!

Animado por essas palavras de fogo, em que Fadinha pusera toda a energia da sua alma, toda a sinceridade do seu coração, o Remígio esperava resignadamente ensejo de fazer valer os direitos do seu amor; entretanto - digamo-lo - o seu espírito vacilante e timorato não tinha forças para a luta a que o incitavam. Ele amava deveras, mas começava a maldizer intimamente aquela singular formosura, que fazia de Fadinha um objeto de cobiça, uma esperança de fortuna, espécie de seguro de vida de uma família inteira. Não obstante a última vontade, o desejo extremo e sagrado do venerando Raposo, receava que a sua insistência causasse a desunião e a desgraça da família. Entretanto, Fadinha, todas as vezes que, iludindo a vigilância materna, lhe podia escrever, repetia cada vez mais veementes protestos de fidelidade.

Mas voltemos ao barão de Moreira que, na estação do Engenho Novo, com o seu terno de flanela clara, o seu chapéu de palha branca, a sua gravata polícroma, o seu alfinete de brilhantes e a rosa enorme que trazia ao peito, contrastava com o aspecto daquela matrona e daqueles dois rapazes vestidos de luto, luto fechado, em que eram pretos até mesmo os punhos e os colarinhos.