Mote
Ai quem soubera querer-vos!
ai quem soubera agradarvos!
ai quem soubera explicarvos!
quanto anela o bem de ver-vos.
1Quem fora tão fino amante,
que mostrara a seu objeto
bem nas entranhas do afeto
prendas do amor palpitante:
quem nessa pira flamante
purificara o temer-vos!
ai quem temera ofender-vos
só por amor de agradar-vos!
ai quem soubera pagar-vos!
Ai quem soubera querer-vos!
2Quem submergido na pena
prantos a mares vertera,
que outro Pedro parecera,
ou qual outra Madalena!
mas se contudo é pequena
para em justiça obrigar-vos
ai quem no rumo de amar-vos,
que de outro amor me desterra,
fora cos olhos na terra!
Ai quem soubera agradar-vos!
3Se a vossa divina mão,
amantíssimo Pai nosso,
(como a de Tomé o vosso)
palpara o meu coração:
ai que delícias então
sentira a razão de amar-vos!
ai quem pudera mostrar-vos
o fino do meu amor!
e as circunstâncias da dor
Ai quem soubera explicar-vos!
4Entrai, Senhor, no meu peito,
onde ao ver-vos retratado
causa sereis, meu amado,
inseparável do efeito:
entrai, que sois bem aceito,
pelo que sei já querer-vos,
e se dentro chego a ter-vos
desta minha indignidade
haveis de ver na verdade,
Quanto anela o bem de ver-vos.