A ILL.ma E EX.ma SR.a
D. Maria Manoela de Brito (Marqueza de Pomares)


Minha querida Manoela,

Para que um livro merecesse o teu nome inscripto na sua primeira pagina, seria indispensavel que esse livro fosse bello na fórma e sincero na intenção.

O modesto volume, que venho offerecer-te, só o segundo requisito póde ter a aspiração de realisar.

Na nossa estreita e leal amisade de alguns annos, amizade em que tens posto os carinhos de uma adorada irmã, eu aprendi a respeitar-te e a amar-te como a um d'esses raros typos femininos de sincera virtude despretenciosa, de alto pensar e de sensibilidade vibrante, que alliam n'uma harmonia felicissima as qualidades d'um grande coração com as faculdades d'um levantado espirito.

Pensas e sentes; comprehendes com singular subtileza e com ampla e ineffavel bondade, tens a curiosidade intelligente, e a sympathia larga e fecunda, que é de todos os predicados d'um entendimento o mais precioso e o mais raro...

Nunca estive perto de ti que me não sentisse melhor; nunca ouvi a tua voz, que não conhecesse de que fundo de sinceridade e de força moral ella provinha...

Perdoa-me se, pensando a teu respeito isto e mais do que isto, te faço uma offerta de tão pouca valia.

Muitos dos estudos incompletissimos, que compõem este livro, foram escriptos á sombra chilreada e fresca das arvores da tua senhorial Portella―na companhia grata, carinhosa, dos dois hospitaleiros donos d'essa vivenda pittoresca e lindissima.

Quantas vezes ahi tenho chegado empallidecida, extenuada, doente e triste, e quantas vezes de lá tenho voltado mais vigorosa na alma e no corpo, trazendo no coração, como um balsamo e como um viatico, a imagem d'essa nobre vida de caridade e de abnegação, que partilhas com o companheiro do teu destino, e em que ambos são um suggestivo exemplo e uma excepção inspiradora...

Se outro valor não tivesse para ti este pobre livro, que tu amas porque é meu, bem o sei,―teria o valor de ter sido quasi todo escripto ao pé das grandes arvores que deram sombra aos jogos da tua infancia, e que tu decerto desejarias que emballassem, com a musica harmoniosa e calmante das suas ramagens murmuras, com o gorgeio alegre dos seus ninhos primaverís, o supremo somno que dormirás mais tarde, na serena beatitude das consciencias boas!...

Lisboa. Dezembro 1888.