L. NO CATU

Entretidos na conversação, os meninos não sentiam passar o tempo. Sem descer do trem, comeram, ali mesmo, em companhia do negociante de fumos, que os forçou a aceitar um pouco do seu farnel.

Em Serrinha, o negociante, que dissera chamar-se Trancoso, trocou algumas palavras com um conhecido, que estava na estação. Falaram de fumo e de açúcar.

— Fabrica-se muito açúcar na Bahia? — perguntou Alfredo, assim que o trem se pôs de novo em movimento.

— Bastante...

— Ah! Como deve ser bonito um engenho de açúcar! Deve ser uma cousa tão interessante!

— É realmente muito interessante. Se os senhores quisessem demorar a viagem, eu poderia levá-los a um engenho. Há um, abaixo de Alagoinhas, na estação do Catu. Devo ir até lá, amanhã, a negócio. Devo encontrar-me no engenho com um sujeito, que talvez me compre uma partida de fumos.

— Oh! Carlos! — exclamou o pequeno — porque não ficamos um dia no Catu?

— Não vale a pena...

— Mas seria tão divertido visitar o engenho!

— Seria! Mas agora já compramos passagens até a Bahia...

— Lá por isso não! — interveio o homem — fazendo as suas declarações ao chefe da estação, os senhores podem interromper a viagem sem perder as passagens.

Carlos, que não queria contrariar o irmão, acabou por aceder ao seu desejo. Ficou decidido que pernoitariam em Catu, visitariam o engenho no dia seguinte, e partiriam à tarde.

Quando o trem parou em Alagoinhas, os meninos reconheceram a importância comercial da cidade. Havia grande movimento na estação. Mas os nossos três viajantes não desceram. Só desceram no Catu, onde o negociante lhes ofereceu pousada até o dia seguinte.

Seriam nove horas da manhã, quando partiram para a visita ao engenho.

A estrada subia uma colina muito suave, de vegetação desigual e emaranhada: moitas de arbustos e pequenas árvores esgalhadas, gramíneas altas, enredadas em trepadeiras e lianas.

— Tudo isto aqui foi roça... — comentou Juvêncio.

— Como sabe você que isto foi roça? — acudiu Alfredo.

— Pelo mato... Além disso, veja ali as “socas”, touceiras de cana...

De fato, de espaço a espaço, via-se o verde alegre da cana de açúcar, afogado no capinzal bravio, que coroava todo o alto.

Torcendo o caminho para o outro lado, avistaram logo, na meia encosta da colina fronteira, um grande casa, baixa, quadrada, com o telhado negro corrido para os quatro lados. Dir-se-ia um enorme barracão, de cujo teto saía uma grossa chaminé, a despejar fumarada espessa, e acompanhada de um tubo esguio, de onde esguichavam, contínua e regularmente, lufadas de vapor branco róseo, como a névoa corada pela manhã.

Em baixo brilhava ao sol a água quieta de um açude, margeado de junco e tábua, e em cujo centro descansavam largas folhas de nenúfar.

— Lá está o engenho! — gritou alegre Juvêncio.

— Onde? — perguntou Alfredo.

— Pois não vê a bagaceira?

— Que bagaceira?

— Aquele chão branco amarelo! — e apontava uma larga mancha creme, que subia por um lado desde quase o açude até o alto do engenho. — É ali que se espalha o bagaço que sai da moenda; não vê aqueles bois que lá estão? Estão comendo bagaço fresco. Não vê aquele homem, com uma vara que está “virando” o bagaço, para que fique bem seco?

— Mas com que fim?

— Para que o bagaço possa ser aproveitado na fornalha do engenho...