XXXII. À ESPERA

Quando Maria das Dores acabou de contar a história do sapo, Carlos, sentado à beira da cama do irmão, falou daquilo que mais o preocupava.

— E o Juvêncio, Alfredo? Que dirá ele, se não chegarmos?

— Há um remédio, — respondeu o pequeno. — Vá você hoje encontrar-se com ele: eu irei amanhã...

— Não pode ser...

— Não pode ser, por quê? Perguntou Maria das Dores. — Seu irmão pode muito bem ficar aqui conosco. Não lhe hão de faltar cuidados.

— Não é isso! — explicou o mocinho — o que digo é que Alfredo não poderá ir sozinho até Riachinho. E quem sabe se amanhã já ele poderá caminhar? Não! Mais vale ficarmos ambos aqui...

E continuou, pensando em voz alta, torturado pela sua preocupação:

— Com certeza, o Juvêncio não continuará sozinho a viagem. Espera-nos hoje... Mas, vendo que não chegamos, há de compreender que aconteceu alguma cousa, e voltará para saber o que houve. Talvez amanhã o tenhamos por aqui... Ah! Lembrome agora... É natural que, se voltar, ele vá imediatamente procurar-nos na venda; e, como ninguém sabe que estamos aqui, pode ficar sem notícias...

E, voltando-se para a rapariga:

— Por onde se vai para a venda? — é longe daqui?

— É muito perto. Já lhe mostro o caminho.

Maria das Dores levantou-se, e saiu acompanhada de Carlos. Foram até a porta da casa. O dia estava lindo e quente. A soalheira ardia.

A casa ficava num declive, na parte mais baixa. Em frente, havia o morro, de terra vermelha, pedras e barro, coberto de um mato ralo, de árvores crestadas e capim escasso, onde algumas cabras pastavam. À direita, havia um mato fechado; à esquerda, uma extensa plantação de mamoneiras e algodoeiros. Defronte da casa, no sopé do morro, levantavam-se algumas paineiras, altas e copadas, que espalhavam em torno uma larga sombra.

— Olhe! — disse a rapariga, estendendo o braço — siga por este caminhozinho, suba o morro, e depois desça: há de achar duas veredas. Tome a da esquerda, que vai dar na estrada real. Siga sempre para a esquerda, que há de logo encontrar a venda; se quer, vou acompanhá-lo...

— Não, não é preciso, disse Carlos. E pôs-se a caminho.

— Maria das Dores voltou para junto de Alfredo. Este, assim que soube que o irmão fora à venda, exclamou:

— Que tolice de Carlos! Pensa que eu não sou capaz de andar sozinho por essas estradas! Como se eu não soubesse ir daqui ao Riachinho!

— Mas note que é longe...

— Que é que tem? De mais longe viemos nós... Viemos do Recife!

— Eu não conheço o Recife... — disse a rapariga.

— Ah! É uma bela cidade! Quando saímos de lá à procura de papai...

Neste ponto, Alfredo parou, e levou a mão a testa, cerrando os olhos.

— Que é — perguntou Maria das Dores — está sentindo alguma cousa?

— Não! Não é nada! — disse o pequeno, enxugando as lágrimas.

É que, ao pronunciar o nome do pai, Alfredo lembrara-se da sua figura, tão nobre, tão simpática, tão carinhosa, e sentiu que uma nuvem de pranto lhe toldava o olhar.

Passou-se esse dia, passou-se o segundo, passou-se o terceiro, sem que Juvêncio aparecesse. Carlos, ia à venda à procura de notícias, e voltava sem elas, apreensivo e desanimado.

Uma idéia fixa o perseguia: “Quem sabe se aconteceu alguma desgraça? — pensava. — Quem sabe se o Juvêncio se viu envolvido em algum barulho? Quem sabe se está preso?...”