Constituição portuguesa de 1838/Título VI: Do Poder Executivo

CAPITULO I

Do Rei



ARTIGO 80º — O Rei é o Chefe do Poder Executivo, e o exerce pelos Ministros e Secretários de Estado.

ARTIGO 81º — Compete ao Rei:

1.º — Sancionar e promulgar as Leis;
2.º — Convocar extraordinariamente as Cortes, prorrogá-las e adiá-las;
3.º — Dissolver a Câmara dos Deputados quando assim o exigir a salvação do Estado.
§ 1.º — Dissolvida a Câmara dos Deputados, será renovada a dos Senadores na forma do Art. 62º.
§ 2.º — O Decreto da dissolução mandará necessariamente proceder a novas Eleições dentro de trinta dias, e convocará as Cortes para se reunirem dentro de noventa dias; sem o que, será nulo e de nenhum efeito.

ARTIGO 82º — Compete também ao Rei:

1.º — Nomear e demitir livremente os Ministros e Secretários de Estado;
2º — Prover os empregos civis e militares na conformidade das Leis;
3.º — Nomear os Embaixadores e mais agentes diplomáticos e comerciais;
4.º — Nomear Bispos, e prover os benefícios Eclesiásticos;
5.º — Nomear e remover os Comandantes de força Armada de terra a mar;
6.º — Suspender os Juízes, segundo a Lei;
7.º — Empregar a força Armada como entender mais conveniente ao bem do Estado;
8.º — Conceder Cartas de naturalização e privilégios exclusivos, a favor da indústria, na conformidade das Leis;
9.º — Conceder títulos, honras e distinções em recompensa de serviços feitos ao Estado, e propor às Cortes as mercês pecuniárias que não estiverem determinadas por Lei;
10.º — Perdoar e minorar as penas aos delinquentes, na conformidade das Leis;
11.º — Conceder amnistia em caso urgente, e quando a pedir a humanidade o bem do Estado;
12.º — Conceder ou negar Beneplácito aos Decretos dos Concílios, Letras Pontifícias e quaisquer Constituições Eclesiásticas que se não opuserem à Constituição e às Leis, devendo preceder aprovação das Cortes se contiverem disposições gerais;
13.º — Declarar a guerra e fazer a paz, dando conta às Cortes dos motivos que para isso teve;
14.º — Dirigir as negociações políticas com as Nações Estrangeiras;
15.º — Fazer tratados de aliança, de subsídios e de comércio, e ratificá-los depois de aprovados pelas Cortes;

ARTIGO 83º— O Rei não pode:

1.º — Impedir a eleição dos Deputados e Senadores;
2.º — Opor-se à reunião das Cortes no dia 2 de Janeiro de cada ano;
3.º — Nomear em tempo de paz, Comandante em Chefe do Exército ou da Armada;
4.º — Comandar a força Armada, ou nomear para Comandante em Chefe, o Príncipe Real ou os Infantes;
5.º — Perdoar ou minorar as penas aos Ministros e Secretários de Estado por crimes cometidos no exercício das suas funções.

ARTIGO 84º — O Rei também não pode, sem consentimento das Cortes:

1.º — Ser ao mesmo tempo Chefe de outro Estado;
2.º — Sair do Reino de Portugal e Algarves: e se o fizer, entende-se que abdica.

ARTIGO 85º — A pessoa do Rei é inviolável e sagrada; e não está sujeita a responsabilidade alguma.

ARTIGO 86º — Seus títulos são: Rei de Portugal e dos Algarves de Aquém e Além-mar, em África Senhor de Guiné, e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e da Índia, etc.; a tem o tratamento de Majestade Fidelíssima.

ARTIGO 87º — O Rei, antes de ser proclamado, prestará nas mãos do Presidente da Câmara dos Senadores, reunidas ambas as Câmaras, o seguinte juramento:

“Juro manter a Religião Católica Apostólica Romana, a integridade do Reino, observar e fazer observar a Constituição Política da Nação Portuguesa, e mais Leis do Reino, e prover ao bem geral da Nação quanto em mim couber”.



CAPÍTULO II

Da Família Real e sua dotação



ARTIGO 88º — O Herdeiro presuntivo da Coroa tem o título de Príncipe Real, e a seu primogénito o de Príncipe da Beira; o tratamento de ambos é de Alteza Real. Todos os mais têm o título de Infantes e o tratamento de Alteza.

ARTIGO 89º — O Herdeiro presuntivo, completando dezoito anos de idade, prestará nas mãos do Presidente da Câmara dos Senadores, reunidas ambas as Câmaras, o seguinte juramento: “Juro manter a Religião Católica, Apostólica Romana, observar a Constituição Política da Nação Portuguesa e ser obediente às Leis e ao Rei.

ARTIGO 90º — As Cortes logo que o Rei suceder na Coroa, lhe assinarão, e à Rainha Sua Esposa, uma dotação correspondente ao decoro de Sua Alta Dignidade.

ARTIGO 91º — As Cortes assinarão também alimentos ao Príncipe Real e aos Infantes depois de completarem sete anos.

ARTIGO 92º — Quando as Princesas ou Infantas houveram de casar, as Cortes lhes assinarão dote; e com a entrega dele cessarão os alimentos.

ARTIGO 93º — Aos Infantes que casarem e forem residir fora do Reino, se entregará por uma vez somente, uma quantia determinada pelas Cortes; com que, cessarão os alimentos que percebiam.

ARTIGO 94º — A dotação, alimentos e dotes de que tratam os artigos antecedentes, serão pagos pelo Tesouro Público.

ARTIGO 95º — Os Palácios e terrenos Reais até agora possuídos pelo Rei, ficam pertencendo aos seus sucessores.




CAPÍTULO III

Da sucessão da Coroa



ARTIGO 96º — A sucessão da Coroa segue a ordem regular de primogenitura e representação entre os legítimos descendentes da Rainha actual, a Senhora D. Maria II; preferindo sempre a linha anterior às posteriores; na mesma linha, o grau mais próximo ao mais remoto; no mesmo grau, o sexo masculino ao feminino; e no mesmo sexo, a pessoa mais velha à mais nova.

ARTIGO 97º— Extintas as linhas dos descendentes da Senhora D. Maria II, passará a Coroa às colaterais; e uma vez radicada a sucessão em uma linha, enquanto esta durar, não entrará a imediata. Extintas todas as linhas dos descendentes e colaterais, as Cortes chamarão ao Trono pessoa natural destes Reinos; e desde então se regulará a nova sucessão pela ordem estabelecida no Art. 96º.

ARTIGO 98º — A linha colateral do ex-Infante D. Miguel, e de toda a sua descendência é perpetuamente excluída da sucessão.

ARTIGO 99º — Se a sucessão da Coroa recair em fêmea, não poderá esta casar senão com Português, precedendo aprovação das Cortes. O Marido não terá parte no Governo, e somente se chamará Rei depois que tiver da Rainha filho ou filha.

ARTIGO 100º — Nenhum Estrangeiro pode suceder na Coroa de Portugal.




CAPÍTULO IV

Da Regência na menoridade ou impedimento do Rei



ARTIGO 101º — O Rei é menor até à idade de dezoito anos completos.

ARTIGO 102º — Durante a menoridade, as Cortes conferirão a Regência a uma pessoa natural destes Reinos; a qual a exercerá até à maioridade do Rei.

ARTIGO 103º — Quando o Rei, por alguma causa física ou moral reconhecida pelas Cortes, se impossibilitar para governar, a Regência será deferida ao imediato sucessor, se já tiver completado dezoito anos.

§ único — Se o imediato sucessor não tiver completado dezoito anos, a Regência será conferida pelo meio estabelecido no Art. 102º.

ARTIGO 104º — Enquanto se não eleger Regente, governará o Reino uma Regência provisória, composta dos dois Ministros e Secretários de Estado mais velhos em idade, e presidida pela Rainha viúva; na falta d’Ela, pelo irmão mais velho do Rei defunto; e na falta de ambos, pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.

ARTIGO 105º — O Regente ou Regência provisória prestarão o juramento mencionado no Art. 87º, acrescentando a cláusula de fidelidade ao Rei; e o Regente há-de-lhe entregar o Governo logo que Ele chague à maioridade ou cesse o impedimento.

ARTIGO 106º — A Regência provisória prestará juramento, não estando as Cortes reunidas, perante a Câmara Municipal da Cidade ou Vila em que se instalar.

ARTIGO 107º — A Regência provisória somente despachará os negócios que não admitirem dilação; e não poderá nomear nem remover Empregados Públicos senão interinamente.

ARTIGO 108º — Os actos da Regência e do Regente são expedidos em nome do Rei.

ARTIGO 109º — Nem a Regência nem o Regente são responsáveis.

ARTIGO 110º — Nos casos em que a Constituição manda proceder à eleição de Regente, se a Regência provisória não decretar, dentro de três dias, a reunião extraordinária das Cortes, a obrigação de as convocar incumbe sucessivamente aos últimos Presidentes e Vice-Presidentes das Câmaras dos Senadores e Deputados.

§ único — Se dentro de quinze dias a convocação não tiver sido feita por algum dos modos acima declarados, as Cortes se reunirão ao quadragésimo dia, sem dependência da convocação.

ARTIGO 111º — Se a Câmara dos Deputados tiver anteriormente sido dissolvida, e no Decreto da dissolução estiverem as novas Cortes convocadas para época posterior ao quadragésimo dia contado da morte do Rei, os antigos Deputados e Senadores reassumem as suas funções até à reunião dos que vieram substituí-los.

ARTIGO 112º — Durante a menoridade do Rei, será seu tutor quem o Pai lhe tiver nomeado em testamento; na falta deste, a Rainha Mãe enquanto se conservar viúva; faltando esta, as Cortes nomearão para tutor pessoa idónea e natural destes Reinos.

§ único — Quando o Rei menor suceder na Coroa a sua Mãe, será tutor dele, e dos Infantes, o Rei seu Pai.

ARTIGO 113º — Nunca será tutor do Rei menor o seu imediato sucessor nem o Regente.

ARTIGO 114º — O sucessor da Coroa, durante a sua menoridade, não pode contrair matrimónio sem consentimento das Cortes.




CAPÍTULO V

Do Ministério



ARTIGO 115º — Todos os actos do Poder Executivo com a assinatura do Rei, serão sempre referendados pelo Ministro e Secretário de Estado competente, sem o que não terão efeito.

ARTIGO 116º — Os Ministros e Secretários de Estado são principalmente responsáveis:

1.º — Pela falta de observância das Leis;
2.º — Pelo abuso do poder que lhes é confiado;
3.º — Por traição;
4.º — Por peita, suborno, peculato ou concussão;
5.º — Pelo que obrarem contra a liberdade, segurança e propriedade dos cidadãos;
6.º — Por dissipação ou mau uso dos bens públicos.

ARTIGO 117º — A ordem do Rei, vocal ou escrita, não salva os Ministros da responsabilidade.

ARTIGO 118º — Os Estrangeiros naturalizados não podem ser Ministros.




CAPITULO VI

Da Força Armada



ARTIGO 119º — Todos os Portugueses são obrigados a pegar em armas para defender a Constituição do Estado e a independência e integridade do Reino.

ARTIGO 120º — O Exército e a Armada constituem a força permanente do Estado.

§ único — Os oficiais do exército e da Armada somente podem ser privados das suas Patentes por sentença proferida em Juízo competente.

ARTIGO 121º — A Guarda Nacional constitui parte da força pública.

§ único — A Guarda Nacional concorre, pelo meio que a Lei determinar, para a eleição dos seus Oficiais; e fica sujeita às autoridades civis, excepto nos casos designados pela Lei.
§ 2.º — Uma Lei especial regulará a composição, organização, disciplina e serviço da Guarda Nacional.

ARTIGO 122º — Toda a força militar é essencialmente obediente; os Corpos Armados não podem deliberar.