Contos Tradicionaes do Povo Portuguez/A carpideira e a viuva
Como diz o outro: A viuva rica, por um olho chora e pelo outro repenica. Uma viuva chamou uma mulher para vir fazer o pranto do costume pela morte do marido. A carpideira começou a dar ais, e a arrepellar-se, e dizia na sua caramunha:
Ai, ai, ai,
Quem lá vai, lá vai.
Passou uma mulher e perguntou-lhe o que é que ella estava a fazer; respondeu a carpideira:
Estou a chorar
O marido alheio,
Por um alqueire
De centeio;
Não sei se m’o dão
Meiado ou cheio.
A anojada, que já não podia encobrir a satisfação de se achar livre do que a tocava, começou aos saltos e a responder-lhe:
Hade ser calcado
E acuculado,
E ainda por cima
Mais um punhado;
Comtanto que fique
Bem depenado.
(Airão, Terra da Feira, Coimbra.)
Notas
editar70. A carpideira. — Pertence ao cyclo do conto antecedente, um dos mais abundantes do nosso Decameron popular.