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UM PASSEIO DE BONDE
 
(Producção dos 17 annos)
 

— Pscio! para onde
Segue este bonde? —
O cocheiro interrogado
— Para a Estação — me responde;
A taboleta não vê? —
— Muito obrigado.
— Não ha de que.

Era um bonde fechado.

Sentei-me, carrancudo,
Pensando em nada ou em tudo,
Que tudo ou nada vem a dar no mesmo,
E eu penso em tudo e em nada
Todas ás vezes que passeio a esmo,
Por dar alivio á mente attribulada.

O bonde parte. Eu estava só. Ninguem
Me fazia
Companhia.
Porém
Alguem
Lá vem:

Uma moça e uma velha entram no carro,
E eu, por ser cavalheiro,
Renuncio a fumar o meu cigarro inteiro,
E deito fóra a ponta do cigarro.

A moça não é feia nem bonita.
Modesta no trajar, traz um vestido
De ramalhuda chita,
E um chapéo já muitissimo batido.

A velha é magra, é alta,
E parece que chora quando ri.
Os dentes lhe fizeram muita falta...
Uma velha mais feia nunca vi!

Aquella hedionda cara
Muito pè de cabello e muita ruga
Me depara,
Sem falar na verruga,
Coisa rara,
Que não sara,
No nariz,
De pingos de tabaco chafariz.

Pente descommunal, de tartaruga,
Lhe adorna a cabelleira, que tresanda
Ao tal sebo de Hollanda.

Emquanto a velha enxuga
O pingo eternamente pendurado,
A moça o verbo namorar conjuga

Co’um janota caolho,
Que entrára ha porco e lhe piscara um olho,
O unico olho que possue — coitado!

Fica a velha de orelha
Em pé, e logo enruga
A branca sobrancelha,
E incha, como incha a negra sanguesuga
Que o Zeferino aluga.

A moça não se importa,
E dirige ao rapaz, leviana e franca,
Peccaminoso olhar de enxova morta,
Que o enleva e transporta,
E suspiros estridulos lhe arranca.

Mas as damas chegaram
Ao seu destino. Ambas se levantaram.
A moça faz um signal
Ao conductor, que repara,
E, com o choque especial
Que produz sempre o bonde quando pára,
Cáe o moça sobre a velha,
Que estava olhando de esguelha;
Cáe a velha sobre o moço;
Cáe o moço sobre mim!
Que alvoroço!
Que chinfrim!

Sairam todos tres. Fiquei pisado,
E ancioso por saber se o resultado

Daquella barafunda
Seria um casamento ou uma tunda.

Um casamento foi. Passado um mez,
Encontrei o caolho namorado
Na rua do Alecrim, de braço dado
A’ moça, e a tal velhota desta vez
Tinha em casa ficado.

Maranhão, 1872.