EPICURO (o prazer ponderado: Hedonismo)

Ou Deus pode e não quer evitar o mal: então não é bom;
ou quer mas não pode: então não é onipotente.
Em cada qual das duas hipóteses: ele não existe!

Juntamente com Sócrates, Epicuro (341–270) é considerado o maior sábio do mundo grego. Seu pensamento reflexivo segue a linha de Demócrito. Ensinou em Samos, Mitilene e Atenas o materialismo atomístico, considerando todos os objetos existentes formados de átomos, partículas indivisíveis, cuja combinação aleatória provoca a diferenciação dos seres. Ele chama de clinamen a inclinação da trajetória dos átomos que constituíam a matéria. Sendo esta declinação incontrolável, o mundo é dirigido pelo acaso. O indeterminismo da combinação atômica se traduz, no plano ético, em termos de liberdade. E, realmente, é no plano da moral que seus ensinamentos tiveram um maior sucesso. Para Epicuro, a natureza é boa e dela devemos extrair o que é mais importante para homem, o que constitui a finalidade última de qualquer ação humana: o prazer! Só que este prazer deve ser "ponderado", calculado, pesado, evitando-se qualquer excesso. Nunca usufruir um prazer se sua conseqüência possa ser deletéria. Se, por exemplo, alguém comer a menos do que precisa para se alimentar (o "dietista"), vai sofrer por inédia; se comer a mais (o guloso), vai sentir dor de estômago. O escritor afro-romano Lucius Apuleius, autor do famoso romance O Asno de Ouro (→Metamorfoses), diz a respeito do vício da bebida: "o primeiro copo sacia a sede; o segundo traz alegria; o terceiro dá prazer; o quarto é o da insensatez". É o equilíbrio entre os prazeres possíveis que constitui o grande ensinamento de Epicuro e não a busca exclusiva da sensualidade e da luxúria, que os adversários atribuíram à sua doutrina. Entre os grandes discípulos de Epicuro, destacamos dois grandes poetas da Roma antiga: Lucrécio e Horácio. É deste último a verdade proverbial : in medio stat virtus (a virtude está no meio termo). O epicurismo deu origem à doutrina moral do Hedonismo, do grego hedone, que significa "prazer". Colocar o prazer como finalidade da vida é de alguns privilegiados que sabem e podem viver bem. Os hedonistas entendem que comer não é só se alimentar; que fazer amor não visa apenas ter filhos; que vestir não significa proteger-se das intempéries ou preservar o pudor; que viajar não é só fazer negócios ou visitar familiares. Em qualquer ato da vida tem que ser procurada uma satisfação prazerosa, juntando o agradável ao útil, curtindo as sensações mais variadas, cultivando o senso estético. Ele afirmou categoricamente:

"É impossível viver com prazer sem viver bem, sábia e justamente,
e é impossível viver bem, sábia e justamente sem viver com prazer!"

Epicuro foi o primeiro pensador ocidental a negar claramente a possibilidade da existência de uma "Transcendência Providente", de uma divindade que se preocupasse com a dor humana. Seu dilema, simplificado na epígrafe deste verbete, tornou-se famoso: se existisse um Deus poderoso e bondoso, não haveria tantos cataclismas cósmicos, tantas guerras, ódios, injustiças e doenças incuráveis. A contradição da existência do mal, junto com a crença na bondade divina, inquietou não apenas Epicuro, mas também outros sábios posteriores que procuraram encontrar uma explicação racional, especialmente Santo Agostinho e Kierkgaard. A resposta de que Deus deu ao homem o "livre arbítrio", pelo qual ele pagaria o preço da maldade cometida, só satisfaz gente obstinadamente crédula. Como acreditar num Deus Onipotente e Misericordioso face à dor das vítimas inocentes de um terremoto ou de um desastre aéreo? Que dizer, então, de genocídios, de ódios étnicos, de bolsões de miséria extrema? Em verdade, o mal, em qualquer uma de suas formas, constitui um mistério racionalmente inexplicável para quem acredita na existência de um Ser Transcendental que, por ser Deus, deve ser "Perfeito", possuindo todas as virtudes, no máximo grau, na virtualidade e na ação. O epicurista prefere não se inquietar com problemas religiosos insolúveis à luz da razão, vivendo apenas o momento presente, da forma mais natural e prazerosa possível, atento apenas em respeitar a liberdade e os direitos do seu semelhante.