A antithese é mair do que pensaste, amigo.
Do berço contra o sol, do mundo contra o lar;
Ante-manhã da vida, hora crepuscular,
Que traz dormente a moça e desperta a menina:
Esta brinca no céo, incarnação divina,
Aquella sonha e crê... quantos sonhos de amor!
São uma e outra a mesma: o fructo sahe da flôr.
Era a flôr perfumosa e bella e delicada,
A seducção da briza, o amor da madrugada;
Mas nasce o fructo amargo, e traz veneno em si...
Aqui morre a menina e nasce a moça; aqui
Cede a criança-luz o passo á mulher-fogo;
E vai-se o cherubim, surge o demonio; e logo
Da terra faz escrava e quer pisal-a aos pés.
Insurjo-me: serei vassallo máo talvez,
Serei; e ao triste exilio o coração condemno.
Peço a menina-flôr, dão-me a mulher-veneno;
Prefiro o meu deserto, a minha solidão:
Ella tem o futuro, e eu tenho o coração.
Bem sabes tu que adoro as louras criancinhas,
E levo a adoração no extasi. Adivinhas
Que encontro na criança um perfume dos céos
E n'ella admiro a um tempo a natureza e Deos.
Pois, quando cinjo ao collo uma menina, e penso
Que inda ha de ser mulher, sinto desgosto immenso;
Porque póde ser boa, e victima será,
E, para ser ditosa, ha de talvez ser má...
De mim dirás com pena: « Oh! coração vasio!
Cinza que foste luz! lama que foste rio! »
Olha, amigo, a mulher é um idolo. Tens fé?
Ajoelha e sê feliz; eu contemplo-a de pé.
Cede a Menina e Moça á lei commum: divina
E bella e encantadora emquanto a vês menina;
Moça, transmuda a face e toma um ar cruel:
Desapparece o archanjo e mostra-se Lusbel.
Amo-a quando é criança, adoro-a quando brinca;
Mas, quando pensativa o rubro labio trinca,
E os olhos enlanguece, e perde a rosea côr,
Temo que o fructo-fel surja d'aquella flôr.