Galeria dos Brasileiros Ilustres/Visconde de Maranguape

Vamos escrever um esboço biográfico tão pobre de datas quanto nos permitem as poucas notas ligeiramente traçadas que nos foram ministradas.

Seria talvez preferível, em vista da completa deficiência em que estamos de maiores dados para a confecção de um trabalho que possa mais tarde servir de base a uma biografia completa pôr, de parte o nome a que se refere esse trabalho irremissivelmente destituído do único merecimento que porventura possam ter os outros do mesmo gênero que temos publicado, e os que pretendemos continuar a publicar; queremos falar das datas correspondentes às fases mais importantes da vida daqueles homens com quem nos ocuparmos; seria talvez preferível nada escrever sobre a vida do Exmo. Sr. Visconde de Maranguape, de quem não podemos obter nem sequer o ano em que nasceu; mas a importância que tem tido e de que ainda hoje goza esse senhor protestaria altamente contra uma resolução que tirasse de seu devido lugar, para colocar em outro menos digno, o nome desse brasileiro que tanto tem aparecido nos negócios de seu país.

Na alternativa pois de fazer um mau esboço de sua vida, ou de deixar em esquecimento e do lado o nome de Sr. Visconde de Maranguape, preferimos o primeiro partido, porque mil vezes preferimos ver tachar o nosso trabalho de falta de gosto e de interesse, do que dar lugar a interpretações, quaisquer que sejam de nossas intenções.

À parte pois todo o juízo desvantajoso que de nós se possa fazer, e entremos em matéria.

Caetano Maria Lopes Gama nasceu na província de Pernambuco e teve por pais o Dr. João Lopes Cardoso Machado e sua mulher D. Ana do Nascimento Gama. Em Pernambuco, ele estudou os primeiros preparatórios para a Universidade de Coimbra, onde estudou por alguns anos, voltando ao Brasil depois de ter concluído o curso a que se destinava, que foi de direito.

Começou sua vida no Brasil empregando-se na magistratura, na qual estreou pelo lugar de juiz de fora do Penedo, na Província das Alagoas, onde esteve muito pouco tempo, porque, tendo sido nomeado ouvidor da mesma Província e Comarca das Alagoas, teve de deixar o lugar de juiz de fora.

Era ainda ouvidor daquela província, onde os primeiros movimentos de independência despertados nos diversos pontos do Brasil ali foram repercutir. O Sr. Lopes Gama tomou neles uma parte muito ativa e tanto se distinguiu entre os que trabalharam pela nossa emancipação política que mereceu ser eleito presidente do governo provisório então estabelecido naquela província.

Logo depois dessa eleição, ele recebeu outra manifestação não menos honrosa do bom conceito em que era tido entre seus concidadãos, e foi esta o diploma de deputado à Assembléia Constituinte, que ainda lhe deu a Província das Alagoas.

Por esse tempo, foi instituída a Imperial Ordem do Cruzeiro, e o Sr. Lopes Gama, em remuneração de seus serviços em prol da Independência, foi um dos contemplados na primeira lista dos condecorados com aquela ordem, honra que é tanto mais apreciável, quanto ela é pouco prodigalizada.

Dissolvida a Assembléia Constituinte, o Sr. Gama caiu nas boas graças do Governo, tanto que ao mesmo tempo que muitos deputados se recolhiam desgostosos a seus lares, alguns eram mandados desterrados para fora de sua pátria; ele foi um dos que receberam do governo provas de confiança e consideração, como é a sua nomeação para presidente da Província de Goiás.

Nesta presidência, prestou os serviços que estavam em suas forças, e foram eles apreciados de tal modo que em recompensa teve a comenda da Ordem de Cristo do Império.

Eleito deputado à primeira legislatura da Assembléia Geral Legislativa, o Sr. Lopes Gama deixou a presidência de Goiás a fim de vir tomar assento, e lá não mais voltou, porque ao terminarem os trabalhos legislativos, voltou à magistratura que tinha deixado, e foi despachado desembargador da Relação da Bahia, com exercício na Casa da Suplicação.

Muito tempo não esteve no exercício desse lugar, porque o Governo Imperial julgou necessário utilizar seus serviços em outra parte onde eles fossem mais úteis, e, em virtude disso, despachou-o presidente da Província do Rio Grande do Sul.

Essa segunda presidência ainda teve ele de deixar para vir tomar assento na Assembléia-Geral, a que tinha sido eleito pela Província de Goiás. E foi durante esse tempo que o Governo nomeou-o inten-dente-geral da polícia e lhe conferiu o título do conselho.

Tendo razões que lhe permitiam continuar no exercício de intendente-geral da polícia, pediu e obteve sua demissão daquele importante cargo, do qual passou novamente ao serviço da magistratura.

Os filhos da Província do Rio de Janeiro, agradecidos ao Sr. Lopes Gama pelos serviços que este lhes havia prestado, quer como intendente da polícia, quer como magistrado, pagaram-lhe a dívida elegendo-o seu senador, lugar em que foi confirmado pela escolha do chefe do Estado e sanção do Senado.

Depois que foi eleito senador, o Sr. Lopes Gama tem sido diversas vezes chamado ao Ministério, e, em 1842, foi despachado conselheiro de Estado efetivo.

Em 1844, quando a Província das Alagoas se sublevou e expeliu seu presidente o conselheiro Bernardo de Sousa Franco, atual ministro da Fazenda, foi o Sr. Lopes Gama o homem que o Governo Imperial reconheceu mais apto para acabar pacificamente aquele movimento revolucionário, e o Governo fez uma boa escolha, porque, graças ao bom conceito, estima e consideração que ali gozava o novo presidente, conseguiu sem derramamento de uma gota de sangue acalmar os ânimos e chamar a seus deveres aquela porção do povo brasileiro momentaneamente desviada do verdadeiro caminho.

Este serviço seu, que decerto não foi dos menores por ele prestados à causa pública, foi galardoado com a grã-dignitária da Ordem da Rosa, com o reconhecimento dos brasileiros em geral e, mui particularmente, dos alagoanos.

A 4 de maio de 1857, tendo ficado o ministério acéfalo pela morte do marquês de Paraná que o tinha organizado, foi chamado a organizar o novo gabinete o Sr. marquês de Olinda, que escolheu para pasta dos Estrangeiros o Sr. Lopes Gama, o qual aceitou o lugar, e continua a desempenhá-lo.

Durante este seu ministério, recebeu o Sr. Visconde de Ma-ranguape do rei de Duas Sicílias a condecoração da grã-cruz da Ordem Real de S. Januário, e além desta a de outras honras e títulos que já temos mencionado, ele conta os seguintes: visconde de Maranguape, ministro aposentado do Supremo Tribunal de Justiça, sócio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da sociedade Amante da Instrução e da Auxiliadora da Indústria Nacional, membro honorário da Academia de Arqueologia da Bélgica e de várias outras sociedades científicas e literárias estrangeiras.