Primavera

 

Fôra desmantelado,
quando, golfando pêla fauce aberta
o atestado dos órfãos e das viuvas,
um grande obús lhe rebentara ao lado...

No modesto recanto do jardim
da aldeia miserável e deserta,
na sua herança má de mudo e eterno,
estático e sem fim,
viu, no outono, morrer o Sol das chuvas,
entrajou-se de neve em pleno inverno;
e agora, à sussurrante primavera
mostra no beiço o riso do jasmim...

Converteu-se. Sorriu á natureza;
perdoou a rabugice ao vento sul;
e, no êxtase imortal – Santa Teresa
da primavera – ele olha esperançosamente,
essa visão seráfica e esplendente,
a claridade mágica do azul...

Na culatra soaberta, onde altos estampidos
gerara a bala estrepitosa e fera,
fizeram ninho as andorinhas...
Culatra! – geradora de gemidos,
geradora de implumes avezinhas!...

Cobre-lhe uma roseira o desnudo cinismo.
Tem a bençãm do luar, nas noites perfumosas.
Vem ungi-lo ás manhãs o sol de Abril.
E o canhão convertido, odorante e gentil,
na imota unção de seu catolicismo,
ouve o «Te Deum» das abelhas sôbre as rosas...