Diana repousando
pintura de Lucas Cranach, o Velho (1472-1553)

Endimião era um belo rapaz que levava seu rebanho para pastar no Monte Latmos. Numa noite com céu claro e límpido, a lua, olhou para baixo e viu que ele estava dormindo. O coração frio da deusa virgem se aqueceu com a beleza insuperável do rapaz, então, ela desceu até onde ele estava, e o beijou, e o ficou observando enquanto ele dormia.

Há uma outra versão para esta história que diz que Júpiter favoreceu o rapaz com o dom da juventude eterna em combinação com o sono perpétuo. De uma pessoa tão abençoada poderemos ter somente algumas histórias para contar. Diana, diziam, cuidava para que a sorte dele não fosse mudada por causa da sua inatividade, pois ela havia multiplicado o rebanho dele, e protegido suas ovelhas e cordeiros dos animais selvagens.

A história de Endimião tem um encanto particular, pelo sentido humano que ela traduz, de modo tão sutil. Vemos em Endimião, o jovem poeta, onde a fantasia e o amor buscam em vão aquilo que possa satisfazê-los, encontrando esse momento favorito na tranquilidade do luar, e embalando ali, sob os clarões da contemplação brilhante e silenciosa, a melancolia e o ardor que o consomem. A história sugere um amor poético e ambicioso, uma vida entregue mais aos sonhos do que à realidade, bem como a uma morte prematura e agradável. --S. G. B.

O "Endimião" de John Keats (1795-1821) é um poema bárbaro e criativo, contendo alguns versos primorosos, como este, dedicado à lua:

"... As vacas dormindo
Deitadas em teu sonho cintilante nos campos divinos.
Uma série de montanhas sobem incessantemente,
Ambiciosas para reverenciar os teus olhos,
E contudo a tua bênção não alcança
Um esconderijo obscuro, um único lugar
Onde o prazer possa ser desfrutado; a carriça, em seu ninho
Conserva a beleza do rosto na tranquilidade da paisagem;" etc., etc.

O poeta Edward Young (1681-1765), no poema "Pensamentos Noturnos," se refere a Endimião desta maneira:

"... Este pensamentos são teus, deusa da noite;
De ti promanam, como os suspiros secretos do que amam,
Enquanto os outros dormem; portanto, Cíntia, os poetas fingem
Velados pelas sombras macias que descem da tua morada,
Seu pastor te consola por ela menos enamorado,
Do que eu por ti"

O dramaturgo John Fletcher (1579-1625), em seu "Pastora fiel," nos diz:

"Como a pálida Diana, caçando no bosque,
Viu pela primeira vez o jovem Endimião, de cujos olhos
Colheu o fogo eterno que jamais se extingue;
E o transportou suavemente durante um sonho,
Suas têmporas adormecidas pela papoula, até o topo
Do velho Latmos, onde ela se inclina todas as noites,
Dourando a montanha com a luz do seu irmão,
Para beijá-lo docemente."

Ficheiro:Diane auprès du cadavre d'Orion from Uranographia by Johann Elert Bode.jpg
Diana sobre o cadáver de Órion
da obra de Daniel Seiter (1642-1705)(

Órion era filho de Netuno. Ele era um belo gigante e poderoso caçador. Seu pai lhe concedeu o poder de vagar pelas profundezas do mar, ou, como dizem, de andar pela sua superfície.

Órion era apaixonado por Mérope, filha de Enopião, rei de Quios, e desejava se casar com ela. Ele acabou com as feras selvagens da ilha, e trouxe os despojos da caça como oferenda para a sua amada; mas como Enopião adiava constantemente a sua permissão, Órion tentou tomar posse da donzela por meio da violência. O pai dela, indignado com a conduta do rapaz, embriagou Órion, mandou cegar o rapaz e o lançou na praia. O herói, agora cego, seguiu as batidas do martelo de um Ciclope, até chegar na ilha de Lemnos, onde encontrou a forja de Vulcano, que se apiedou do infeliz, e lhe ofereceu Quedalião, um de seus homens, como seu guia até a morada do céu. Colocando Quedalião em seus ombros, Órion rumou para o Oriente, e lá encontrou o deus sol, que com sua luz lhe restaurou a visão.

Depois deste fato, o gigante viveu como caçador em companhia de Diana, de quem ele era favorito, e dizem até que ela pretendia se casar com ele. O irmão dela ficou muito descontente e muitas vezes chegou a repreendê-la, mas ela não lhe dava crédito. Um dia, ao observar Órion que caminhava pelo mar com a cabeça um pouco acima da superfície, Apolo o indicou com o dedo para sua irmã, dizendo que ela não conseguiria acertar aquele ponto negro em cima das águas. A deusa dos arcos disparou a flecha que teve um desfecho infeliz. As ondas rolaram o corpo sem vida de Órion até a praia, e deplorando seu erro fatal com uma chuva de lágrimas, Diana o colocou entre as estrelas, onde ele ressurge como um gigante, com uma guirlanda, uma espada, e uma pele de leão, e uma clava. Sírio, o seu cachorro, fez questão de segui-lo, e as Plêiades, foram voando atrás dele.

As Plêiades eram filhas de Atlas, e ninfas que faziam parte do séquito de Diana. Um dia Órion as viu, se apaixonou por elas e decidiu persegui-las. Angustiadas, pediram aos deuses para que suas formas fosse mudadas, e Júpiter se compadeceu delas e as transformou em pombas, tornando-as uma constelação no céu. Embora elas fossem em número de sete, apenas seis estrelas eram visíveis, pois Electra, uma delas, diziam ter deixado o seu posto para que ela não pudesse contemplar as ruínas de Troia, pois essa cidade tinha sido fundada por Dardano, seu filho. Esse fato exerceu tamanho efeito sobre as suas irmãs que desde então as estrelas começaram a ficar pálidas.

O poeta Henry Wadsworth Longfellow (1807-1882) escreveu um poema sobre o "Desaparecimento de Órion." As estrofes seguintes são aquelas onde ele faz menção à esta história mítica. Devemos levar em conta que no globo celeste Órion é representado com seus trajes em pele de leão e segurando uma clava. No instante em que as estrelas da constelação desaparecem uma a uma por causa do luar, o poeta nos diz:

 
Órion, o caçador gigante
da obra Uranografia de Johann Elert Bode (1747-1826)(

"Cai a pele vermelha de leão
Aos seus pés, dentro do rio.
Sua clava poderosa não mais fere
As têmporas do touro; mas ele,
Cambaleante como outrora ao longo da praia,
Quando foi cegado por Enopião
Buscou o ferreiro em sua forja,
E subindo pela garganta estreita,
Fixou seus olhos sem expressão no sol."

O poeta Alfred Tennyson (1809-1892) possui uma teoria sobre as Plêiades:

"Muitas noites contemplei as Plêiades, ascendendo a suave sombra,
Deslizando como uma revoada de vaga-lumes num adorno de prata."

--Locksley Hall.

Byron se refere às Plêiades desaparecidas:

"Como as plêiades desaparecidas, não mais foram vistas lá embaixo."

Veja também os versos da poetisa inglesa Felícia Hemans (1793-1835) sobre o mesmo tema.

 
Aurora e Titono
da obra de Francesco de Mura (1696–1784)

Aurora, a deusa do Amanhecer, como a sua irmã Lua, era algumas vezes inspirada pelo amor dos mortais. O seu grande favorito era Titono, filho de Laomedonte, rei de Troia. Ela o raptou, e convenceu Júpiter a conceder-lhe a imortalidade; porém, esquecendo-se de adicionar a juventude ao presente que havia dado, depois de algum tempo ela começou a perceber, para seu grande pesar, que ele estava envelhecendo. Quando o seu cabelo começou a ficar todo branco ela não mais desejava a sua companhia; embora ele residisse ainda em seu palácio, se fartasse dos alimentos ambrosiais, e usasse os trajes celestiais. Com o passar do tempo, ele não conseguia mais movimentar seus braços e pernas, e então, ela o trancou em seu quarto, onde a sua voz fraca, por vezes, podia ser ouvida. E por último, ela o transformou num gafanhoto.

Mêmnon era filho de Aurora e Titono. Ele era rei dos etíopes, e vivia no extremo oriente, nas costas do Oceano. Ele tinha vindo, junto com seus guerreiros, para oferecer ajuda ao seu pai na Guerra de Troia. O rei Príamo o recebeu com grandes honras, e ouvia com admiração as suas histórias sobre as maravilhas nas costas do Oceano.

No mesmo dia de sua chegada, Mêmnon, impaciente com tanto repouso, conduziu suas tropas até os campos de batalha. Antíloco, o valoroso filho de Nestor, foi morto por suas mãos, e os gregos já estavam fugindo, quando Aquiles apareceu e a batalha foi reiniciada. Uma disputa longa e discutível se estabeleceu entre Aquiles e o filho de Aurora; finalmente, a vitória foi declarada por Aquiles, Mêmnon foi derrotado, e os troianos fugiram desalentados.

Aurora, que do seu trono celestial havia assistido, com preocupação, os riscos que o seu filho desafiou, quando ela percebeu que ele iria ser derrotado, ordenou que seus irmãos, os Ventos, trouxessem o corpo dele até a margem do rio Esepo[1], na Paflagônia. De madrugada, a Aurora chegou, acompanhada pelas Horas e pelas Plêiades, chorando e lamentando muito o filho morto. A Noite, apiedando-se da sua dor, cobriu o céu de nuvens; toda a natureza chorou o filho de Aurora. Os etíopes ergueram seu túmulo nas margens do rio que fluía até o bosque das ninfas, e Júpiter fez com que as fagulhas e cinzas de sua pira funerária se transformassem em aves, as quais, se dividindo em dois bandos, combateram sobre a pira até caírem sobre as chamas. Todos os anos, no aniversário de sua morte, elas retornam e celebram as exéquias de Mêmnon da mesma maneira. Aurora ficou inconsolável com a perda do filho. Suas lágrimas caem sem cessar, e podem ser vistas nas primeiras horas da manhã sob a forma de gotas de orvalho que cai sobre a relva.

Diferentemente da maioria das maravilhas contadas pela mitologia antiga, ainda existem alguns monumentos que comemoram este fato. Nas margens do rio Nilo, no Egito, existem duas estátuas colossais, uma das quais dizem ser a estátua de Mêmnon. Registros de escritores antigos afirmam que quando os primeiros raios do sol nascente caem sobre a estátua, um som é ouvido vindo da direção do monumento, o qual eles comparam aos sons de uma corda de harpa. Pairam algumas dúvidas sobre a identificação da estátua existente com aquela descrita pelos antigos, e os sons misteriosos lançam ainda mais dúvidas. No entanto, não faltam alguns testemunhos modernos com relação a esses acordes que ainda podem ser ouvidos. Já foi sugerido que os sons produzidos pelo ar em confinamento que escapam por fendas ou cavernas sobre rochedos podem ter fornecido algum fundamento para a história. Sir Gardner Wilkinson, um viajante de nossos dias, autor de grande autoridade, examinou a estátua de que falamos, e descobriu que nela havia um buraco, e que "na borda da estátua existe uma pedra, que ao receber uma pancada, emite um som metálico, que ainda poderia ser utilizado para enganar um visitante, que esteja predisposto a acreditar em seus poderes."

A estátua de Mêmnon que emite sons é o tema favorito, a quem os poetas fazem referências. Erasmus Darwin (1731-1802), em seu poema "O Jardim Botânico" diz o seguinte:

"Então, o sol sagrado do templo de Mêmnon
Acordes de harmonia vibram no canto matinal;
Tocados por fachos orientais, ecoam de volta
A lira vivaz, vibrando todas as suas cordas;
Passagens harmoniosas refletem a suavidade dos sons,
E ecos sagrados amplificam à canção de adoração."
Livro I., 1., 182.

 
Ácis e Galateia
da obra de Claude Lorrain (1604–1682)

Cila era uma bela virgem que vivia na Sicília, e favorita das ninfas do mar. Muitos pretendentes a desejavam, mas ela rejeitava todos eles, e se refugiava na gruta de Galateia, e contava à ninfa como ele era perseguida. Um dia a deusa, enquanto Cila arrumava seus cabelos, ouvia a história, e disse à ela, "No entanto, minha querida, os seus perseguidores não fazem parte da raça rústica de homens, a quem possas rejeitar quando quiseres; mas eu, filha de Nereu, e protegida por um grupo muito grande de irmãs, não encontrei refúgio para a paixão do Ciclope, exceto no fundo do mar;" e as lágrimas lhe impediram que continuasse a falar, as quais foram enxugadas por seus delicados dedos, acalmando a deusa, "Diga-me, querida," disse Cila, "o motivo dos teus pesares." Galateia então, respondeu, "Ácis era filho de Fauno e de uma Náiade."

"Seu pai e sua mãe o amavam muito, mas o amor deles não era igual ao meu. Pois o belo rapaz só dava atenções a mim, e ele tinha apenas dezesseis anos de idade, e a barba rala apenas começava a escurecer a sua face. Da mesma forma que eu buscava a companhia dele, o Ciclope também buscava a minha; e se você me perguntasse se o meu amor por Ácis ou se o meu ódio por Polifemo era mais forte, não saberia dizê-lo; eles tinham medidas iguais. Oh Vênus, como a tua força é poderosa! este feroz gigante, o terror dos bosques, a quem nenhum estrangeiro infeliz escapava ileso, e que desafiava o próprio Jove, aprendeu a sentir o que era o amor, e, movido por uma paixão à minha pessoa, esquecia dos rebanhos e de sua caverna onde nada lhe faltava."

"Então, pela primeira vez, o ciclope começou a cuidar da própria aparência, e tentar tornar-se mais agradável; ele alisou com um pente o emaranhado de seus cabelos, e fazia a barba com uma foice, contemplava na água sua fisionomia rústica, e procurava melhorar o seu aspecto. Sua adoração por matar, sua ferocidade e sede de sangue já não sentia mais, e os navios que chegavam à sua ilha iam embora com segurança. Polifemo caminhava pela praia de um lado para outro, criando longas trilhas com seus passos pesados, e, quando se cansava, ia descansar na tranquilidade da sua caverna."

"Há um penhasco que se projeta para dentro do mar, cujas águas lavam suas encostas de ambos os lados. Para lá subiu um dia o enorme Ciclope, e ficou sentado enquanto seu rebanho se dispersava por todos os lados. Colocando no chão o cajado, que poderia ser usado como mastro para segurar a vela de um navio, e pegando seu instrumento, feito por inúmeros tubos, fez com que as montanhas e as águas ecoassem os acordes de sua canção. Eu fiquei escondida debaixo de uma pedra ao lado do meu adorado Ácis, e ouvia a canção que tocava ao longe. Ele fazia exagerados elogios à minha beleza, mesclados com censuras apaixonadas com relação à minha frieza e crueldade."

"Quando ele terminou de cantar, ele se levantou, e, qual um touro raivoso que não consegue ficar parado, desapareceu no meio do bosque. Ácis e eu não nos preocupamos mais com ele, até que de repente, ele apareceu no lugar que permitia a nossa visão quando estávamos sentados. "Eu vejo vocês," exclamou ele, "e farei que este seja o último dos seus encontros amorosos." Sua voz era um rugido que somente um Ciclope furioso conseguiria emitir. Até o Monte Etna tremeu com o seu bramido. Eu, tomada por completo terror, mergulhei na água. Ácis se virou e fugiu, gritando, "Salvai-me, Galateia, salvai-me, meus pais!" O Ciclope o perseguia, e arrancando uma pedra da lateral da montanha, a arremessou contra ele. Embora apenas um canto da pedra houvesse tocado seu corpo, ela o derrubou."

"Tudo o que eu podia fazer eu fiz por Ácis. Eu o cobri com as honras de seu avô, o deus dos rios. O sangue vermelho escorria por debaixo da rocha, mas aos poucos foi ficando mais pálido e parecia a correnteza de um rio que havia ficado turva por causa da chuva, e com o passar do tempo foi se tornando clara. A pedra rachou, e a água, que jorrava da fenda, pronunciava um murmúrio agradável."

E assim, Ácis foi transformado num rio, e o rio reteve o nome de Ácis.

O poeta John Dryden (1631-1700) em seu poema "Simão e Ifigênia,"[2] conta a história de um bufão que se transformou num cavalheiro pelos poderes do amor, de uma forma que associa traços de semelhanças com a velha história de Galateia e o Ciclope.

"O que os cuidados de um pai ou de um tutor
Poderiam incutir com dores em seu coração bruto,
O melhor instrutor, o Amor, o inspirou num único instante,
Quando foram disparados os estéreis fundamentos da fecundidade.
O amor ensinou a ele o pudor, e o pudor com amor pela luta
Logo ensinou a ele as doces cortesias da vida."

Notas e Referências do Tradutor

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  1. Rio Esepo: rio perto de Troia, que flui do Monte Ida até o mar.
  2. ((en)) Simão e Ifigênia