N'um dia de 1839[1], frei Antonio é chamado a casa de Joaquim Nunes; o lojista, antigo creado de Gonçalo da Silveira. Vae, e acha-o enfermo.
—Sr. frei Antonio—disse o merceeiro—chamei-o para me ajudar a saldar as minhas contas com o mundo, para levar diante de Deus os meus livros de rasão sem nodoa. Estou muito doente, e não espero nada da medicina. O que eu tenho a dizer-lhe, não é o receio da morte que m'o faz dizer. Ha dias que eu preparava esta occasião, e oxalá que sendo a vontade de Deus, eu sobrevivesse á resolução que tomei. Ora diga-me; como se porta o sr. Alvaro?
—Melhor do que as minhas ambições.
—Já não teme que elle torne ao caminho da perdição?
—Confio em Deus, não é n'elle, nem em mim, confio em Deus que não.
—Elle sabe que sou eu o que lhe dou as mezadas?
—Não sabe: cumpri religiosamente a sua vontade.
—Deve ter dito muito mal do avarento creado de seu pae...
—Nem uma palavra, desde que está em minha companhia. Parece que confessa com o seu silencio gratidão á mão generosa que o soccorre.
—Ora diga-me, sr. fr. Antonio, envergonhar-se-ha elle de vir visitar um creado antigo da sua casa, doente?
—Ó senhor, isso é duvidar do coração de meu sobrinho; essa licença estava eu para pedir-lh'a...
—Pois que venha, e venha tambem sua mulher, desejo ve'-los, e o mais breve que possa ser.
Notas
editar- ↑ Nota de Transcrição: No original aparece 1839, apesar de não estar coerente com a linha temporal do romance. O ano de 1849 é referido mais adiante na obra pelo que deve ser esta a data correcta.