I
Ô! de casa, nobre gente,
Escutai e ouvireis,
Lá das bandas do Oriente
São chegados os três Reis

Gaspar, Melchior, Baltazar
Vieram lá do Oriente
Adorar o Deus Menino,
A Jesus onipotente.

O primeiro trouxe ouro,
Para o seu trono dourar;
O segundo trouxe incenso,
Para o Menino incensar;
O terceiro trouxe mirra,
Por saber qu'era imortal. . .

Abri a porta,
Se quereis abrir,
Que somos de longe,
Queremos nos ir.

II

Acordai, se estais dormindo,
Deste sono em que estais,
Pois em noite tão ditosa
É bom que vós não durmais.

Esta casa é mui bem feita,
Por dentro, por fora não:
Por dentro cravos e rosas,
Por fora manjericão.

Oh! senhor dono da casa,
Ramo de alecrim maior,
A sua sombra nos cobre,
Quer chova, quer faça sol.

Oh! senhor dono da casa,
Foi homem que Deus pintou,
Meta a mão nas algibeiras,
Pague já quem o louvou.

Ora dêem,
Se têm o que dar,
Que somos de longe,
Queremos andar!

III

Bendito, louvado seja,
O Menino Deus nascido,
Que no ventre de Maria
'Steve por nós escondido.

Há três dias que eu ando
Procurando sem achar,
Mas fui dar com ele em Roma
Vestidinho num altar.

Abram a porta,
Se têm de abrir,
Que somos de longe,
Queremos nos ir.

IV

Do letargo em que caístes,
Despertai, nobres senhores;
Vinde ouvir notícias belas,
Que vos trazem os pastores.

Senhora dona de casa,
Bote azeite na candeia,
Que eu não tenho a confiança
De mandar na casa alheia.

Aqui estou na vossa porta
Feito um feixinho de lenha,
À espera da resposta
Que de vossa boca venha.

Dois de cá,
Dois de lá;
Mariquinhas no meio
Não pode sambá.

Vinde abrir a vossa porta,
Se quereis ouvir cantar;
Acordai, se estais dormindo,
Vos viemos festejar.

Sabei que é nascido um Deus,
Soberano e Onipotente,
Adorado das nações
E das mais bravia gente.

Os três Reis, de longes terras,
Vieram ver o Messias,
Desejado há tanto tempo
De todas as profecias.

Tenho sede,
Não quero pedi
Pois tenho vergonha
Da gente daqui.

VI

Os três Reis, com grande gosto,
Seguidos de muita gente,
Se humilharam abatidos
A um Deus Onipotente.

Lhe trazem suas ofertas
Com um amor filial,
Aplaudem todos contentes
O seu tão lindo Natal.

Incenso, mirra e ouro
É o que vêm ofertar,
Despem ceptros e coroas
Com prazer mui singular.

Mortais, não fieis na sorte,
Vinde ao Menino aplaudir;
O seu virtuoso exemplo
Deveis contentes seguir.

Se há de vir,
Que venha já:
Garrafas de vinho,
Doce de araçá.

VII

A grandeza, a opulência,
Detestai-as sem receio;
Vede corno o Deus menino
A dar-vos exemplo veio.

Ó senhor dono da casa,
Com ampla satisfação,
Abra já a sua porta
Pois tem grande coração.

Hoje é dia de festejo,
E de um prazer sem segundo,
Pois é nascido o Menino
Salvador de todo o mundo.

O senhor dono da casa,
Deve já aqui estar,
Pois sabemos quanto gosta
Com prazer também brincar.

Há tanto tempo
Que nós já chegamos,
Que é de as galinhas
Que nós já ganhamos?

VIII

Somos gentes de bom gosto,
Gostamos de conviver,
Também queremos que todos
Mostrem contento e prazer.

Na Lapinha de Belém
E' nascido o Deus Menino,
Entre as turbas dos pastores
Sendo um Senhor tão Divino.

Abra a porta,
Também a janela,
Que eu quero gozar
A cor de canela.

IX

Abri já a vossa porta,
Pois temos muito que andar;
Antes que o dia amanheça
Queremos a Belém chegar.


Queremos hoje brincar
Com contento e com prazer,
Pois para nossa ventura
Veio o Menino nascer.

Na Lapinha de Belém,
Adorado dos pastores,
Nasceu um Deus Menino,
Sendo Senhor dos senhores.

Festejemos ao Menino,
Nascidinho em Belém,
Pois é a vossa ventura
É o nosso Sumo Bem.

Tenho vontade
De uma cousa pedi;
Mas tenho vergonha
Das gentes daqui.

X

Somos gentes muito boas,
Sabemos bem conviver;
Bebemos bem aguardente
Com alegria e prazer.

O nosso bom Deus amante
Quis o mundo resgatar,
Nascendo em um presepe
Para todos nos salvar.

Abra a porta
Bem devagarinho,
Que eu quero dizer:
Adeus, meu benzinho.

XI

Senhora D. Maria,
Espelho do relação,
Quem fala nessa senhora
Dobra o joelho no chão.

O senhor dono da casa
É uma folha de papel,
Inda espero o ver na praça
Com bastão de coronel.

Os pequenos desta casa,
Não se dêem por agravados,
Picaram por derradeiros
Por serem mais estimados.

Senhora dona da casa,
Olhos de pedra redonda,
Daquela pedra mais fina
Em que o mar combate a onda.

O telhado desta casa
É telhado de virtude;
Eu passei aqui doente,
Hoje de boa saúde.

Se eu soubesse
Que havia função,
Trazia mulatas
Do meu coração.

XII

Esta noite tão ditosa
É bom que vós não durmais,
Porque tão alta ventura
Não é justo que percais.

Vinde ouvir simples cantatas
De grosseiros camponeses,
Das aldeias conduzindo
Cordeiros e mansas reses.

As serranas enfeitadas
Em prazeres vão saltando;
Os mancebos, os velhinhos,
Todos, todos vão chegando.

Vossas ofertas, senhores,
Trazei, que as conduziremos,
E com toda a companhia
Iguais as repartiremos.

Somos meninas
Da casa da mestra,
Viemos fugidas
Promode a tarefa.

XIII

Frangos, galinhas, perus,
Doce, queijo e requeijão,
Tudo nós aceitaremos
Vindo de bom coração.

Nada de flores queremos,
Porque cheiro sem sabor,
Suavisa um só sentido,
Não refrigera o calor.


Melancias, ananases,
Belas mangas, mangabinhas,
Até servem nesta noite
Uns pombinhos e pombinhas.

Ora dêem,
Se têm de dar!
Que somos de longe
Queremos andar.

XIV

Venham ovos, venham uvas,
Limões doces e cajus;
E então sim, seremos gratos
Para sempre, Amem Jesus.

Para que tão lauta ceia
Mal não nos possa fazer,
Em cima da fruta e doce
Mandai-nos dar que beber.

Se quiser
Que eu seja daí,
Você dá pipocas,
Eu dou 1nundubi.

XV

Vinho do Porto e do Duque,
Bordeaux, moscatel, champanha,
E tudo que é licor fino
Fabricado em terra estranha.

Esta vai por despedida
Por cima destes telhados,
As pessoas que nos ouvem
Tenham os dentes quebrados.

A dona da casa
E' boa de dá,
Garrafas de vinho,
Doce de araçá.