CAPITULO CXLVII

 
O desatino
 

Mandei logo para a imprensa uma noticia discreta, dizendo que provavelmente começaria a publicação de um jornal opposicionista, dahi a algumas semanas, redigido pelo Dr. Braz Cubas. O Quincas Borba, a quem li a noticia, pegou da penna, e acrescentou ao meu nome, com uma fraternidade verdadeiramente humanistica, esta phrase: «um dos mais gloriosos membros da passada camara.»

No dia seguinte entra-me em casa o Cotrim. Vinha um pouco transtornado, mas dissimulava, affectando socego e até alegria. Vira a noticia do jornal, e achou que devia, como amigo e parente, dissuadir-me de semelhante idéa. Era um erro, um erro fatal. Mostrou que eu ia collocar-me n’uma situação difficil, e de certa maneira trancar as portas do parlamento. O ministerio, não só lhe parecia excellente, o que aliás podia não ser a minha opinião, mas com certeza viveria muito; e que podia eu ganhar com indispol-o contra mim? Sabia que alguns dos ministros me eram affeiçoados; não era impossivel uma vaga, e... Interrompi-o nesse ponto, para lhe dizer que meditára muito o passo que ia dar, e não podia recuar uma linha. Cheguei a propôr-lhe a leitura do programma, mas elle recusou energicamente, dizendo que não queria ter a minima parte no meu desatino.

— É um verdadeiro desatino, repetiu elle; pense ainda alguns dias, e verá que é um desatino.

A mesma cousa disse Sabina, á noite, no theatro. Deixou a filha no camarote, como Cotrim, e trouxe-me ao corredor.

— Mano Braz, que é que você vae fazer? perguntou-me afflicta. Que idéa é essa de provocar o governo, sem necessidade, quando podia...

Expliquei-lhe que não me convinha mendigar uma cadeira no parlamento; que a minha idéa era derrubar o ministerio, por não me parecer adequado á situação — e a certa fórmula philosophica; afiancei que empregaria sempre uma linguagem cortez, embora energica. A violencia não era especiaria do meu paladar. Sabina bateu com o leque na ponta dos dedos, abanou a cabeça, e tornou ao assumpto com um ar de supplica e ameaça, alternadamente; eu disse-lhe que não, que não, e que não. Desenganada, lançou-me em rosto preferir os conselhos de pessoas estranhas e invejosas aos della e do marido. — Pois siga o que, lhe parecer, concluiu; nós cumprimos a nossa obrigação. Deu-me as costas e voltou ao camarote.