Ao dealbar tronaram as buzinas e a caravana moveu-se em direção à caverna.
A grande estrela ainda luzia no céu.
Os magos seguiram à frente nos dromedários e, em torno deles, nitiam , caracolavam os ginetes dos cavaleiros com que os seus telizes dourados, os seus caparações de púrpura.
Quando a turba defrontou com a caverna todos os homens apearam e, respeitosamente, com humildade de servos, deixando no limiar os papuzes marchetados, os magos penetraram zumbridos , como se fossem os rastos, levando nas mãos, devotamente, as páreas significativas.
Recebeu-os o patriarca e, como a Virgem se levantasse, com Jesus ao colo, os três homens prostraram-se de joelhos, descobrindo-se, depondo os turbantes e, inclinando a cabeça, ficaram um momento em veneração silenciosa.
O primeiro falou oferecendo a mirra.
- Homem, filho de Deus, a árvore do deserto deu do seu trono a resina que te ofereço; o seu perfuma é uma força que se opões à destruição da carne: eterniza o corpo como a virtude eterniza o espírito.
O segundo inclinou-se com um escrínio cheio de ouro:
- Rei, das minas, onde fervilham os veios rutilantes, deram a poeira que te ofereço: ouro, símbolo do poder, chama fria da terra. Tudo ele vence: a miséria e a própria virtude. Desoprime e escraviza, redime e perverte, é o bem e é o mal. Nas mãos mumificas é luz que aclara e salva; nas mãos cruéis é chama que consome.
O negro falou por último com uma patena de incenso:
- A árvore instila a lágrima que recende, lágrima que, ao lume, se converte em fumo e evola, demandando o céu, como homenagem de terra.
Como lágrima, é uma concentração; como aroma, é uma oblata. É o incenso com que se glorificam os deuses. É a oferenda das terras negras ao Deus que redime.
Gente, que afluíra à caverna, pastores e seareiros, mesteirais, velhos, mulheres e crianças das arribanas próximas entraram e, diante da palha humilde, toda a grandeza e toda a humildade confraternizaram e também o sol, como enviado do céu
, adorando o infante da misericórdia que baixara para cumprir as profecias trazendo aos homens a religião do amor.
E Maria, deslumbrada, sem ouvir as vozes glorificadoras, olhava, contemplava, adorava o pequenino filho.
O sol cercou-se de esplendor e a Virgem, de pé no meio da turba, com Jesus ao colo, era o puríssimo altar sobre o qual se mostrava às gentes o divino perdão.