Ao chegarem à porta quis Vilela retirar-se. Souberam porém que Flávio estava em cima. Os dois olharam um para o outro, Vilela atônito, João Lima fulo de cólera.

Subiram.

Na sala estavam D. Mariana e o Padre Flávio; ambos de pé, em frente um do outro, Mariana com as mãos de Flávio entre as suas.

Os dois estacaram à porta.

Seguiu-se um longo e profundo silêncio.

— Meu filho! meu amigo! exclamou Vilela dando um passo para o grupo.

D. Mariana tinha soltado as mãos do jovem sacerdote e deixara-se cair numa cadeira; Flávio tinha os olhos baixos.

João Lima adiantou-se calado. Parou em frente de Flávio e encarou-o friamente. O padre ergueu os olhos; havia neles uma grande dignidade.

— Senhor, disse Lima.

D. Mariana levantou-se da cadeira e atirou-se aos pés do esposo.

— Perdão! exclamou ela.

João Lima empurrou-a com um braço.

— Perdão; é meu filho!

Eu deixo ao leitor imaginar a impressão deste lance de quinto ato de melodrama. João Lima esteve cerca de dez minutos sem poder articular palavra. Vilela olhava espantado para todos.

Enfim rompeu a palavra o negociante. Era natural pedir uma explicação; pediu-a; foi-lhe dada. João Lima exprimiu toda a sua cólera contra Mariana.

Flávio lastimara do fundo d'alma a fatalidade que o levou a produzir aquela situação. No delírio de conhecer sua mãe, não se lembrara de mais nada; apenas leu a carta que lhe fora entregue pelo Padre Vilela, correra à casa de D. Mariana. Ali tudo se explicara; Flávio preparava-se para sair e não voltar ali mais se fosse preciso, e em todo caso não divulgar o segredo nem ao Padre Vilela, quando este e João Lima os surpreenderam.

Tudo estava perdido.

D. Mariana recolheu-se ao Convento da Ajuda onde faleceu no tempo da guerra de Rosas. O Padre Flávio obteve uma vigaria no interior de Minas, onde veio a falecer de tristeza e saudade. Vilela quis acompanhá-lo, mas o jovem amigo não o consentiu.

— De tudo o que me poderias pedir, disse Vilela, é isso o que mais me dói.

— Paciência! respondeu Flávio; eu preciso da solidão.

— Tê-la-ás?

— Sim; preciso da solidão para meditar nas conseqüências que o erro de um pode trazer a muitas existências.

Tal é a moralidade desta triste história.