Horto (1910)/Na capellinha

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NA CAPELLINHA


Lembrança do collegio



Entrou na Egreja sorrindo,
Coberta com um fino véo.
O seu rostinho era lindo
Como o da Virgem do Céo.

Foi ajoelhar-se contricta
Ao pé do sagrado altar,
E, com piedade infinita,
Principiou a rezar.

Um doce sorriso veiu
Encher-lhe a bocca de luz.
Uniu as mãos sobre o seio,
Fitou os olhos na Cruz.

O que dizia... Alguem pode
Adivinhar o que diz
A prece que ao labio acode
Emquanto a gente é feliz?

Nessa idade para que
Se reza... (saberei eu?)
A gente reza porque
Tambem se reza no Céo.

E ella, tão meiga e pura,
Que não conhecia o mal,
E que guardava a ventura
No coração virginal;

Em sua fé de creança
Ingenua e cheia de amor,
Talvez pedisse a esperança
Para os que vivem na dôr.

Talvez tivesse gemidos
Para quem vive a chorar,
Para os que vagam perdidos
Nas frias ondas do mar.

E emquanto o labio querido
Orava piedoso assim,
Do negro olhar commovido
O pranto rolou por fim.

E deslisaram sem calma
As bagas por sua tez
No desconsolo de um’alma
Que chora a primeira vez.

Su’alma santa onde moram
A Luz, a Innocencia e o Bem,
Pedindo pelos que choram
Foi soluçando tambem.

E comprehendendo o segredo
D’aquella doce emoção,
Eu disse baixinho, a medo,
Fallando ao meu coração:

Bemditos nós que soffremos
Varados por magua atroz...
Emquanto assim padecemos
Os anjos pedem por nós.