“Quem bate na minha porta,
Quem bate, quem está aí?
—É Dom Bernaldo Francês,
A sua porta mande abrir.
No descer da minha cama
Me caiu o meu chapim ;
No abrir da minha porta
Apagou-se o meu candil.
Eu levei-lhe pelas mãos,
Levei-o no meu jardim;
Me pus a lavar a ele
Com água de alecrim;
E eu como mais formosa
Na água de Alexandria.
Eu lhe truxe pelas mãos,
Levei-o na minha cama.
Meia noite estava dando.
Era Dom Bernaldo Francês;
Nem sonava, nem movia,
Nem se virava pra mim.
"O que tendes, D. Bernaldo,
O que tendes, que maginas?
Si temes de meus irmãos,
Eles estão longe de ti;
Si temes de minha mãe,
Ela não faz mal a ti;
Si temes de meu marido,
Ele está na guerra civil.
—Não temo de teus irmãos,
Qu'eles meus cunhados são;
Não temo de tua mãe,
Qu'ela minha sogra é;
Não temo do teu marido,
Qu'ele está a par contigo.
"Matai-me, marido, matai-me;
Qu'eu a morte mereci;
Si tu eras meu marido
Não me davas a conhecer.
—Amanhã de pra minhã
Eu te darei que vestir;
Te darei saia de ganga,
Sapato de berbotim,
Trago-te punhal de ouro
Para te tirar a vida...
O túmulo que a levava
Era de ouro e marfim;
As tochas que acompanhavam
Eram cento e onze mil,
Não falando de outras tantas
Que ficou atrás pra vir.
"Aonde vai, cavaleiro,
Tão apressado no andar?
—Eu vou ver a minha dama
Que já há dias não a vejo.
"Volta, volta, cavaleiro,
Que a tua dama já é morta,
É bem morta que eu bem vi,
Si não quereis acreditar
Vai na capela de São Gil.
"Abre-te, terra sagrada,
Quero me lançar em ti.
"Para, para, Dom Bernaldo,
Por mode ti já morri."
—Mas eu quero ser frade
Da capela de São Gil;
As missas que eu disser
Todas serão para ti.
"Não quero missas, Bernaldo,
Que são fogo para mim:
Nas filhas que vós tiver
Botai nome como a mim;
Nos filhos que vós tiver
Botai nome como a ti.