Desde então os dois meninos fizeram-se amigos.
Foi justamente a grande distância, o contraste, que os separava, que os uniu um ao outro.
As extremidades tocavam-se.
Teobaldo era detestado pelos colegas por ser muito desensofrido e petulante; o outro por ser muito casmurro e concentrado. O esquisitão e o travesso tinham, pois, esse ponto de contato — o isolamento. Achavam-se no mesmo ponto de abandono, viram-se companheiros de solidão, e é natural que se compreendessem e que se tornassem afinal amigos inseparáveis.
Uma vez reunidos, completavam-se perfeitamente. Cada um dispunha daquilo que faltava no outro; Teobaldo tinha a compreensão fácil, a inteligência pronta; Coruja o método, e a perseverança no estudo; um era rico; o outro econômico; um era bonito, débil e atrevido; o outro feio, prudente e forte. Ligados, possuiriam tudo.
E, com o correr do ano, por tal forma se foram estreitando entre os dois os laços da confiança e da amizade, que afinal nenhum deles nada fazia sem consultar o camarada.
Estudavam juntos e juntos se assentavam nas aulas e à mesa.
Por fim, era já o André quem se encarregava de estudar pelo Teobaldo; era quem resolvia os problemas algébricos que lhe passavam os professores; era quem lhe arranjava os temas de latim e o único que se dava à maçada de procurar significados no dicionário. Em compensação o outro, a quem faltava paciência para tudo isso, punha os seus livros, a sua vivacidade intelectual à disposição do amigo, e dividia com este os presentes e até o dinheiro enviado pela família, sem contar as regalias que a sua amizade proporcionava ao Coruja, fazendo-o participar da ilimitada consideração que lhe rendia todo o pessoal do colégio, desde o diretor ao cozinheiro.
De todas as gentilezas de Teobaldo, a que então mais impressionara ao amigo foi o presente de uma flauta e de um tratado de música, que lhe fez aquele à volta de um passeio com o diretor do colégio.
Coruja trabalhava à sua mesa de estudo quando o outro entrou da rua.
— Trago-te isto, disse-lhe Teobaldo apresentando-lhe os objetos que comprara.
— Uma flauta! balbuciou André no auge da comoção. — Uma flauta!
— Vê se está a teu gosto.
Coruja ergueu-se da cadeira, tomou nas mãos o instrumento, e experimentou-lhe o sopro, e ficou tão satisfeito com o presente do amigo que não encontrou uma só palavra para lho agradecer.
— Que fazias tu? perguntou-lhe Teobaldo.
Mas correu logo os olhos pelo trabalho que estava sobre a mesa e acrescentou:
— Ah! É ainda o tal catálogo!
— É exato.
— Gabo-te a paciência! Não seria eu!
E, tomando a bocejar uma das folhas escritas que o outro tinha defronte de si.
— Isto vem a ser?...
— Isto é a numeração das obras, respondeu André.
— Ah! Vai numerá-las...
— Vou. Para facilitar.
— E isto aqui? interrogou Teobaldo, tomando outra folha de papel.
— Isto é uma lista dos títulos das obras.
— E isto?
— O nome dos autores.
— Depois reúnes tudo?
— Reuno.
— Melhor seria fazer tudo de uma forma mais prática. Assim, não é tão cedo que te verás livre dessa maçada!
— Há de ficar pronto.
Mas estava escrito que o célebre catálogo não teria de ficar acabado nas férias deste ano. Uma circunstância extraordinária veio alterar completamente os planos do autor.
Logo ao entrar das férias, o pai de Teobaldo apresentou-se no colégio para ir em pessoa buscar o filho.
Entrou desembaraçadamente a gritar pelo rapaz desde a porta da rua.
— Ah! É V. Exa. exclamou o diretor com espalhafato, logo que o viu. E correu a tornar-lhe o chapéu e a bengala.
— Bela surpresa! Bela surpresa, Sr. Barão! Tenha a bondade de entrar para o escritório!
— Vim buscar o rapaz. Como vai ele?
— Muito bem, muito bem! Vou chamá-lo no mesmo instante. Tenha a bondade V. Exa. de esperar alguns segundos.
E, como se a solicitude lhe dera sebo às canelas, o Dr. Mosquito desapareceu mais ligeiro que um rato.
O Sr. Barão do Palmar, Emílio Henrique de Albuquerque, era ainda nos seus cinquenta e tantos anos uma bela figura de homem.
A vida acidentada e revessa, a que o condenara sempre o seu espírito irrequieto e turbulento não conseguira alterar-lhe em nada o bom humor e as gentilezas cavalheirescas de sua alma romântica e afidalgada.
Como brasileiro, ele representava um produto legítimo da época em que veio ao mundo.
Nascera em Minas, quando ferviam já os prelúdios da independência, e seu pai, um fidalgo português dos que emigraram para o Brasil em companhia do Príncipe Regente e de cujas mãos se passara depois para o serviço de D. Pedro I, dera-lhe por mãe uma formosa cabocla paraense, com quem se havia casado e de quem não tivera outro filho senão esse.
De tais elementos, tão antagônicos, formou-se-lhe aquele caráter híbrido e singular, aristocrata e rude a um tempo, porque nas veias de Emílio de Albuquerque tanto corria o refinado sangue da nobreza, como o sangue bárbaro dos tapuias.
Crescera entre os sobressaltos políticos do começo do século, ouvindo roncar em torno do berço a tempestade revolucionária, que havia de mais tarde lhe arrebatar a família, os amigos e as primeiras e mais belas ilusões políticas.
Desde muito cedo destinado às armas, matriculou-se na Escola Militar, fez parte da famosa guarda de honra do primeiro Imperador, e, com a proteção deste e mais a natural vivacidade do seu temperamento mestiço, chegou rapidamente ao posto de capitão.
Teve, porém, de interromper os estudos para fazer a lamentável guerra de Cisplatina, donde voltou seis meses depois, sem nenhuma das ilusões com que partira, nem encontrar os pais e amigos, que sucumbiram na sua ausência, e nem mais sentir palpitar-lhe no coração o primitivo entusiasmo pelos defensores legais da integridade nacional.
Orfanado, pois, aos vinte e dois anos, senhor de uma herança como bem poucos de tal procedência apanhavam nessas épocas, pediu baixa do Exército e levantou o vôo para a Europa, fazendo-se acompanhar por um criado que fora de seu pai, o Caetano, aquele mesmo criado que, trinta e tantos anos depois, apareceu no colégio do Dr. Mosquito vestido de libré cor de rapé, com botões amarelos.
Ah! Se esse velho quisesse contar as estroinices que fez o querido amo pelas paragens européias que percorreu! se quisesse dizer quantas vezes não expôs a pele para livrá-lo em situações bem críticas! quantas vezes por causa de alguma aventura amorosa ou por alguma simples questão de rua ou de café não voltaram os dois, amo e criado, para o hotel com o corpo moído de pauladas e os punhos cansados de esbordoar!
Durante essas viagens levaram eles a vida mais aventurosa e extravagante que é possível imaginar; só voltaram para o Brasil no período da regência, depois da abdicação do Sr. D. Pedro I, por quem o rapaz não morria de amores.
Tornando à província, Emílio, talvez na intenção de refazer os seus bens já minguados, casou-se, a despeito da oposição do Caetano, com uma rapariga de Malabar, filha natural de um negociante português que comerciava diretamente com a Índia.
Atirou-se então a especular no comércio, mas o seu temperamento não lhe permitia demorar-se por muito tempo no mesmo objeto e, achando-se viúvo pouco depois de casado, lançou as vistas para Diamantina, que nessa ocasião atraía os ambiciosos, e lá se foi ele, sempre acompanhado pelo Caetano, explorar o diamante.
Tão depressa o viram em 1835 na Diamantina como em 1842 em Santa Luzia na revolução ao dos liberais mineiros, lutando contra a célebre reação conservadora manifestada pela lei de 3 de Dezembro.
A galhardia e valor com que se houve nessas conjunturas valeu-lhe a estima de Teófilo Otoni e outros importantes chefes do seu partido. Dessa estima e mais dos bens particulares que então gastou na política foi que se originou o título, com que mais tarde o agraciaram.
A sua atitude política, a sua riqueza e os seus dotes naturais haviam-lhe já conquistado na corte as melhores relações deste tempo.
Uma vez, por ocasião de trazer para aí uma excelente partida de diamantes, travou conhecimento com um importante fazendeiro de café, em cuja fazenda se hospedou por acaso.
Esse homem, mineiro da gema, era no lugar a principal influência do partido conservador e, sem dúvida, um dos que primeiro explorou a famosa Mata do Rio, que então começava a cobrir-se de novas plantações.
O fazendeiro tinha uma filha e Emílio cobiçou-a para casar. Mas o encascado político, descendente talvez dos antigos emboabas que avassalaram o centro de Minas, não cedeu ao primeiro ataque, e Emílio teve de lançar mão de todos os recursos insinuativos da sua raça para conseguir captar a confiança do pai e o coração da filha. Quando lá tornou segunda vez, deixou o casamento ajustado. Então foi ainda a Diamantina liquidar os seus negócios e, voltando à Mata, recebeu por esposa a mulher que, mal sabia ele, estava destinada a ser a mais suave consolação e o melhor apoio do resto de sua vida.
Foi desse enlace que nasceu Teobaldo, logo um ano depois do casamento.
Emílio só reapareceu na corte em 1847, onde os seus correligionários, então no poder, o agraciaram com o título de Barão do Palmar; mas voltou logo para Minas e tratou de estabelecer com os seus capitais uma fazenda na vizinhança da do sogro, que acabava de falecer.
Foi esse o melhor tempo de sua vida, o mais tranquilo e o mais feliz. Só depois de casado, Emílio pode avaliar e compreender deveras a mulher com quem se unira; só depois de casado descobriu os tesouros de virtude que ela lhe trouxe para casa, escondidos no coração.
Laura, assim se chamava a boa esposa, era um destes anjos, criados para a boa segurança do lar doméstico; uma dessas criaturas que nascem para fazer a felicidade dos que a cercam.
Em casa, senhores chamavam-lhe "Santa". E este doce tratamento condizia com os seus atos e com a sua figura.
— Esta, sim! exclamava o Caetano, entusiasmado. Esta, sim, é uma esposa de conta, peso e medida!
Pouco a pouco, Emílio foi amando a mulher, ao ponto de chegar a estremecê-la, o que até aí lhe parecia impossível.
No meio de toda essa felicidade, Teobaldo deu os seus primeiros passos pela mão do pai, da Santa e do fiel Caetano, que já o adorava tanto como os outros.
O pequeno era o mimo do casa; era o cuidado, o enlevo, a preocupação de quantos o viam crescer.
Com que sacrifício não consentiu, pois, o Barão do Palmar que o filho, daí a seis anos, seguisse sozinho para um colégio de Londres, donde havia de passar a Coimbra.
Mas assim era necessário, porque Emílio, então comprometido no tráfico dos negros africanos, viu-se atrozmente perseguido por Euzébio de Queiroz, terror dos negreiros e seu inimigo político.
Eis aí quem era e donde vinha o pai de Teobaldo.
E agora, visto aos cinquenta e tantos anos, aquele tipo correto na forma e um pouco desabrido nas maneiras, estava ainda a dizer a sua procedência mestiça. Por mais despejado que fosse todavia, cativava sempre com muita graça e muita insinuação. Ar gentil e franco, gestos largos, coração tão aberto a tudo e a todos, que até ao mal franquearia a entrada, desde que houvesse lá por dentro uma idéia de vingança.
Possuía ele um destes temperamentos desensofridos e ao mesmo tempo saturados de bom humor; tão prontos a zombar dos grandes perigos, como a inflamar-se à menor palavra que de longe lhe tocasse em pontos de honra. Temperamentos que não conhecem meio termo e que vão da pilhéria à bofetada com a rapidez de um salto.
Amava loucamente a mulher e adorava o filho. Todas as suas paixões de outrora, todos os seus gostos e hábitos sacrificados ao atual meio em que ele vivia, como que se transformaram em um sentimento único, em um amor de quinta-essência, em uma dedicação sem limites por Teobaldo. Mas não sabia educá-lo e por cegueira da afeição permitia-lhe todos os caprichos. A mais extravagante fantasia do menino era uma lei em casa do Sr. Barão.
Defronte daquele pequeno Deus, ninguém seria capaz de levantar a voz. Teobaldo vivia entre os seus parentes como um príncipe no meio da sua corte; o pai, a mãe, uma irmã desta, que agora a acompanhava, todos pareciam apostados em merecer-lhe as graças em troca de amor e submissão.
Pode-se, pois, facilmente calcular qual não seria a comoção de Emílio ao ver o filho, quando o foi buscar nas férias, depois de tantos meses de ausência.
Teobaldo! exclamou o barão, correndo para ele de braços abertos.
O menino saltou-lhe ao pescoço e deixou-se beijar, enquanto perguntava pelos de casa.
E depois, a queixar-se:
— Ora! prometeste que virias visitar-me, e nem uma vez!...
— Não pude abandonar a fazenda um só dia durante o ano! Aquilo por lá tem sido o diabo!...
Ia continuar, mas interrompeu-se para dizer ao filho:
— Anda daí rapaz! Mexe-te, que, ao contrário chegaremos muito tarde!. .. Vamos! Eu te ajudo preparar a mala. Onde é o teu quarto?
Teobaldo tomou de carreira a direção do dormitório e o pai acompanhou-o, a mexer com todos os pequenos que encontrava no caminho.
— Quem é o tal André, de que falas tu nas cartas com tanta insistência? perguntou ao filho, enquanto este emalava a sua roupa.
— Ah! o Coruja? É o meu amigo; mostro-to já; espera aí.
E, quando atravessavam o salão, já com a mala pronta, Teobaldo exclamou, puxando o braço do pai:
— Olha! É aquele! Aquele que está ao lado do diretor.
— E aquele padre, quem é? Aquele que conversa com o Dr. Mosquito?
— Deve ser o tutor de André.
— O tutor?
— Sim, porque André já não tem pai, nem mãe; foi o vigário quem tomou conta dele e quem o meteu no colégio.
— E agora veio buscá-lo e leva-o para casa durante as férias?...
— Talvez não. Já o ano passado, deixou-o ficar aqui sozinho com os criados.
— Mas pode ser que desta vez não aconteça o mesmo...
Emílio foi, porém, convencido logo do contrário pelo que ouviu entre o diretor e o padre, cujo diálogo ia se esquentando a ponto de lhe chegar perfeitamente ao ouvidos.
— Abuso?... exclamava o vigário. Não vejo onde esteja o abuso!
— Pois não! replicava o diretor. Pois não! V. Rev.ma vem ter comigo e pede-me que tome conta de seu pupilo pela metade do que recebo pelos outros alunos; eu consenti, consenti, porque sabia que o pobre menino não tem outra proteção além da sua... Pois bem! chegam as férias; o senhor não manda buscar, o que é sempre um inconveniente para um estabelecimento desta ordem, e...
— Não sei porque... interrompeu o padre.
— Sei eu, gritou o diretor. E a prova, olhe, é que tencionava fazer pelas férias um passeio à corte com minha família, e não fiz!...
— Sim, mas o senhor, naturalmente, não foi detido só por este...
— Engana-se; seu pupilo foi o único aluno que ficou no colégio durante as férias!
— Não é culpa minha!
— De acordo e não é disso que faço questão. Deixa-me continuar...
— Pode continuar.
— Como dizia: o senhor, não satisfeito com o abatimento que lhe fiz durante o ano inteiro, pediu-me ainda que lhe fizesse um novo abatimento durante as férias. Permita que lhe diga: o que V. Rev.ma pagou não deu sequer para as comedorias, porque não é com tão pouco que se alimenta aquele rapaz! Não imagina que apetite tem ele!
André, ao ouvir esta acusação, abaixou o rosto, envergonhado como um criminoso, e pôs-se a roer as unhas, sentindo sobre si o olhar colérico do padre, que o media da cabeça aos pés.
— Pois bem! prosseguiu o diretor; chegam de novo as férias e, quando estou resolvido a remeter-lhe o menino, vem o senhor e diz que desta vez não pode pagar tanto como das outras!... Ora! há de V. Rev.ma convir que isto não tem jeito!
— Seria uma obra de caridade!... objetou o padre.
— Sim, mas eu já fiz o que pude...
— Pois vá! Pagarei o mesmo que nas férias do ano passado.
— Não, senhor, não serve! V. Rev.ma leva o menino e, se quiser, pode apresentar-mo de novo em Janeiro. De outra forma não!
— Tenho então de levar o pequeno comigo? exclamou o padre, fazendo-se vermelho.
— De certo, respondeu o diretor sem hesitar. As férias inventaram-se para descanso e eu não posso ficar tranquilo, sabendo que há um aluno em casa. Dá-me mesmo trabalho que me dariam vinte! Não! Não.
— Mas, doutor!
— Não, não quero! É um cuidado constante. Retiram-se todos os empregados e fica aí o menino só com o servente; de um momento para outro, uma travessura, uma tolice de criança, pode ocasionar qualquer desgraça, e serei eu por ela o único responsável! Não quero!
— E se eu pagar o mesmo que pago durante ano? perguntou o reverendo já impaciente e cada vez mais vermelho.
— Nem assim.
— Nem assim? E quanto é preciso então que eu pague?
— Nada, porque estou resolvido a não aceitar.
— De sorte que eu tenho por força de levar o pequeno?...
— Fatalmente.
— Pois então, pílulas! exclamou o padre, deixando transbordar de todo a cólera; pílulas!
E, voltando-se para o Coruja:
— Vá! vá fazer a trouxa e avie-se!
O Coruja afastou-se tristemente enquanto o padre resmungava: Peste! só me serve para me dar maçadas e fazer-me gastar o que não posso!
O barão, que a certa distância ouvira tudo ao lado do filho, disse a este em voz baixa:
— Pergunta ao teu amigo se ele quer vir conosco passar as férias na fazenda.
Teobaldo, satisfeito com as palavras do pai, foi de carreira ter com o Coruja e voltou logo com uma resposta afirmativa.
— Reverendo, disse então o fidalgo aproximando-se do padre com suma cortesia. Por sua conversação com o Dr. Mosquito fiquei sabendo que o contraria não poder deixar o seu pupilo no colégio; lembrei-me, pois, se não houver nisso algum inconveniente, de levá-lo com o meu filho, a passar as férias na fazenda em que resido.
O diretor deu-se pressa em apresentá-lo um ao outro, desfazendo-se em zumbaias com o barão. E o padre, cuja fisionomia se iluminara à proposta do adulado, respondeu curvando-se:
— Meu Deus! O Sr. barão pode determinar o que bem quiser!... Receio apenas que o meu pupilo não saiba talvez corresponder a tamanha gentileza; uma vez, porém, que o generoso coração de V. Exa. sente vontade de praticar esse ato de caridade...
— Não, não é caridade! atalhou Emílio, francamente. Não é por seu pupilo que faço isto, mas só para ser agradável a meu filho... Eles são amigos.
— Se V. Exa. faz gosto nisso.
— Todo o gosto.
— Pois então pequeno está às ordens de V. Exa.
— Bem. Ficamos entendidos. Levo-o comigo e trá-lo-ei com Teobaldo, quando se abrirem de novo as aulas.
O reverendo entendeu a propósito contar ao Sr. barão, pelo miúdo, a história do "pobre órfão"; como ele o recolhera e sustentava, repetindo no fim de cada frase "Que não estava arrependido" e, terminando com a financeira e conhecida máxima: "Quem dá aos pobres, empresta a Deus!..."