Diz o dictado "Vox populi vox Dei" mas o povo, as mais das vezes, se deixa levar pelas apparencias:
Se o vizinho, ao sair, mostra um semblante risonho é porque é — feliz; se, na rua, vê passar um par muito unido, o taxa de feliz. Ganha um pobre uns "boros" na loteria, ri o desiludido, casa um corajoso e o pobre povo os considera felizes, muito felizes!...
Triste illusão! Grande engano!
Feliz é o que tem os olhos da Razão fechados, cuja vida corre á revelia sem que o menor esforço, a menor luta a modifiquem. Felizes são as que ignoram a existencia do mundo que em torno a si se movimenta; que, vendo, não reparam nesse lodo medonho, profundo, em que se debate a Humanidade; que desconhecem as bellas máscaras com que a hipocrisia humana se reveste.
Esses, embora não riam, são felizes.
Mas, quem, no riso do vizinho, descobre uma lágrima; quem vê, através da sorte na loteria, o precipicio medonho, colossal do ouro; quem vê no casamento, um negocio vantajoso (da parte dela, quasi sempre), esse pobre e coitado mortal, esse é a imagem da vida, porque em si reside a Dor, a grande Dor que consome, destrói e renova as civilizações e os povos.
Antonieta de Barros
Florianapolis, 9 — 923.
Esta obra entrou em domínio público pela lei 9610 de 1998, Título III, Art. 41.
Caso seja uma obra publicada pela primeira vez entre 1929 e 1977 certamente não estará em domínio público nos Estados Unidos da América.