Alfredo não ficou convencido com as palavras do pai; gostava da rapariga, e até faria por ela o sacrifício de renunciar aos anagramas; abandoná-la por uma divergência entre os pais, era coisa que ele não entendia. Entrou a pensar o que faria.

Entretanto, aproximava-se a festa da matriz; os leitores hão de lembrar-se que Chico Teles era o presidente da irmandade, e Manoel Tobias protetor perpétuo. Antes da festa haveria eleição da mesa, e foi esse o campo de uma grande batalha.

Infelizmente, Chico Teles só lutou pela defensiva; o cargo de Manoel Tobias não era sujeito à eleição; mas o seu era, e Tobias moveu toda a vila, para apeá-lo do cargo.

Oito dias antes, as folhas dos dois contendores começaram a agitar a questão. O Farol, de Manoel Tobias, começou por um artigo de fundo estirado e indigesto; o jornalista, querendo provar que Chico Teles não podia exercer o cargo que ocupava, viu-se obrigado a remontar aos gregos, e a descrever o ostracismo. A resposta de Chico aproveitou-se da alusão histórica, e lembrou que também Aristides fora desterrado, apesar de justo, mas que ele confiava no bom senso do povo da vila.

Três dias antes da eleição fervia tudo; circularam as chapas, umas verdes, outras amarelas; faziam-se visitas, e até as folhas adversárias deram suplementos todas as tardes, cheios de artigos coruscantes.

O sr. Anselmo aproveitou esta situação, e disse no Azorrague:

Parece que não é um presidente de irmandade que se vai eleger, mas um papa dos doidos, e a irmandade há de ver-se atrapalhada para escolher entre o Teles e o Tobias. O nosso conselho é que escolha ambos.

Enfim, raiou o dia.

Teles vestiu-se de ponto em branco, pôs a sua comenda, e encaminhou-se para a matriz; já lá estava Manoel Tobias, igualmente enfeitado; conversava com o padre vigário, mas via-se pelo olhar vago que ele não se preocupava muito com a reverendíssima conversa.

Chico Teles tinha arranjado de véspera uns vinte capangas, que se foram postar à porta da igreja para dar-lhe vivas, apenas ele assomasse. Assim aconteceu. Chico Teles fez-se muito comovido, e agradeceu com o chapéu aquela manifestação de popularidade.

Fez-se a eleição. Foi muito solene; Teles contava sair, e Tobias estava certo de derrotá-lo: o candidato apresentado por este era uma figura secundária, mas a sua influência dava-lhe valor.

Para vencer este pleito tinham ambos posto em prática os meios mais engenhosos; promessas, nomeações, e até hábitos de Cristo, tudo. Que luta! No fim de alguns minutos, porém, tudo estava acabado; Teles venceu, e estava presidente da irmandade por mais um ano.

Tobias saiu da sacristia, e não voltou, senão à hora do sermão, por pedido do padre vigário, que nesse dia impingia um pot-pourri de Bourdaloue e Antônio Vieira.

Teles deu um grande jantar a vários amigos, e festejou desse modo o seu triunfo.

No dia seguinte o Atalaia publicava uma longa narração da festa, e quanto à eleição do presidente dizia:

Apesar das cabalas e das torpeza de certo caturra desta vila, o sr. Francisco Teles foi reeleito presidente da irmandade de S. Francisco. Foi um verdadeiro triunfo. Nem podia deixar de ser assim. Quem possui a popularidade de tão distinto chefe não deve temer nunca.

Para prova de que o sr. Teles é o querido do povo basta ver como a opinião pública o recebeu à porta da igreja com vivas e aclamações.

Honra à população desta vila!

No dia em que saiu este artigo, os vinte capangas da véspera foram à casa de Chico receber um suplemento ao donativo que já lhes havia este fornecido. Quando os viu à porta, Alfredo que assistira à cena da véspera, e lera a folha do dia, foi correndo chamá-lo:

— Meu pai! meu pai! aí está a opinião pública.