N'aquela casa, onde havia tanto tempo não entrava tal quantia, representaria uma pequena fortuna, e traria com ela uns lampejos de conforto.
Porque não disse, pois, à pobre creatura que tinha aquele dinheiro? Porque lh'o não entregou?
E' que êle tinha a sua ideia!... aquela grande ideia que o transformára, que representava, talvez, a salvação de todos! Aquele dinheiro, ia jogá-lo.
Ia tentar a sorte com êle e tinha a certeza que havia de ganhar.
Se o mostrasse, se communicasse a sua resolução, decerto a mulher se oporia, e adeus fortuna, adeus felicidade!
Tudo se perdia, era mais que certo, porque Martha não consentiria que êle fosse jogar o pão que faltava em casa.
Sim, mas o pão de pouquissimos dias, n'uma economia reles e miseravel, e, findos êles, viria a fome, essa negra e pavorosa fome que ha tanto os ameaçava!
Escusava, pois, de sentir a mais tenue sombra de um remorso, porque êle não teria tão cedo a probabilidade de arranjar quantia igual.
O pequeno tinha as botas rotas; era preciso comprar outras.
Á pobre mulher, tão meiga, tão linda como fora, hoje fanada pelo sofrimento, vergando ao peso da miseria, triste e abatida, tão nova aiuda e já envelhecida pela desgraça, nem podia levá-la a tomar um pouco de ar, porque nem quasi tinha já que vestir. Era atroz! era barbaro esse destino maldito que assim se obstinava em persegui-los!