A esperança
13

 


A treva recrescia! E o homem caminhava
Como folha amarella involta n'um tufão!...
No sangue de seu pae o filho se manchava,.
E o irmão succumbia ao ferro do irmão!...

O mundo era então como um lago de sangue
Aonde se nutria o feroz despotismo...
O homem caminhava até cair exangue.
Sem que viesse ungil-o a agua do baptismo!..

II


A arvore do mal na terra inda não tomba!
Ainda a noite cobre a humanidade inteira!
Oh! quando surgirá no bico d'uma pomba
Um ramo d'oliveira?!..,

A noite já vai longa... a aurora ha de vir perto
Com aromas e sons e toda a luz que tem...
Hade nascer a flor n'este immenso dezerto,
Symbolisando o bem...

O homem será livre à luz d'um novo dia!...
O ferro do algoz não mais hade ser visto!...
E já, ao longe, o sol esplendido irradia
Sobre a face de Christo!...

III


E Christo vem então!.. ― Não tarda o dia novo.. ―
E pára, scisma, pensa ao vêr assim o povo.
Sem norte, sem razão, tresmalhado, sem lei...
― O povo que só vê no despotismo um rei!.. ―
«Meu Deus, como salval-o?! E como dar-lhe regras,
«Se não o cobre a luz e as trevas são tão negras!..
«Se não tem no seu peito o germen do amor!..
«Meu Pae, Meu Pae, valei-me...»
Então frio suor
Cobriu a sua face... e Christo meditava
N'aquella multidão, que, cega, caminhava...

·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·

·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·
·

Seu rosto, um dia, teve uma alegria estranha!
Firme subiu Jesus do Golgotha á montanha
E lá, já sobre a cruz, alguem lhe ouviu dizer:
— Para salvar o povo é preciso morrer —

Setembro de 1865

 

Alberto Pimentel.

 

 
Clotilde

Romance original
 
Por
 

— Se v. exc.a me dá licença eu lerei em seu nome o seu destino.

— Já que lhe é concedido o dom de lêr no futuro, não só lhe dou licença de interrogar a minha estrella, mas até lhe peço que o faça. Tenha com tudo cautella, não seja ella mentirosa nas suas respostas.

Os passeiantes chegaram em grente da rua dos loureiros. Josephina voltou-se e perguntou aos dois moços.

— Não vos recordaes de quantas vezes corremos por esta rua, para vêr qual chegava primeiro ao fim?

— Fazes de nós bem esquecidos, respondeu Paulino, suspirando.

A filha do marquez continuou a conversar com o primo, e o seu irmão disse a Clotilde:

— Eu respondi por ambos nós, minha senhora e v. exc.a já talvez não se lembre dos bellos dias que passamos todos.

— Essa supposição é injusta, snr. Paulino, é impossivel esquecerem-se essas impressões da infancia; ellas gravam-se em nossos corações em caracteres que o tempo não tem poder de riscar.

N'este momento chegavam ao pé d'elles o marquez e a baronesa.

— Meu filho, a maior parte dos convidados já subiram para os salões, dizia o marquez, será bem recolhermos.

Clotilde pareceu acordar d'um sonho! A