amigo já resonava, com a vela accesa — e com um livro aberto sobre o leito, um livro meu, trazido de Lisboa para me recrear no paiz do Evangelho, o Homem dos tres calções. Descalçando os botins, sujos da lama veneravel da Via-Dolorosa — eu pensava na minha Cybele. Em que sacratissimas ruinas, sob que arvores divinisadas por terem dado sombra ao Senhor, passára ella essa tarde nevoenta de Jerusalem? Fôra ao valle do Cedron? Fôra ao branco tumulo de Rachel?...
Suspirei, amoroso e moído: e abria os lençoes bocejando — quando distinctamente, através do tabique fino, senti um ruido d’agua despejada n’uma banheira. Escutei, alvoroçado: e logo n’esse silencio negro e magoado que sempre envolve Jerusalem, me chegou, perceptivel, o som leve d’uma esponja arremessada na agua. Corri, collei a face contra o papel de ramagens azues. Passos brandos e nús pisavam a esteira que recobria o ladrilho de tijolo; e a agua rumorejou, como agitada por um dôce braço despido que lhe experimentava o calor. Então, abrazado, fui ouvindo todos os rumores intimos de um longo, lento, languido banho: o espremer da esponja; o fôfo esfregar da mão cheia de