me de ter visto, ao outro dia, no nosso pateo, uma senhora alta e gorda, com uma mantilha rica de renda negra, a soluçar diante das manchas de sangue do papá, que ninguem lavára, e já tinham seccado nas lages. Á porta uma velha esperava, rezando, encolhida no seu mantéo de baetilha.
As janellas da frente da casa foram fechadas; no corredor escuro, sobre um banco, um candieiro de latão ficou dando a sua luzinha de capella, fumarenta e mortal. Ventava e chovia. Pela vidraça da cozinha, emquanto a Marianna, choramigando, abanava o fogareiro, eu vi passar no largo da Senhora da Agonia, o homem que trazia ás costas o caixão do papá. No alto frio do monte a capellinha da Senhora, com a sua cruz negra, parecia mais triste ainda, branca e nua, entre os pinheiros, quasi a sumir-se na nevoa; e adiante, onde estão as rochas, gemia e rolava, sem descontinuar, um grande mar d’inverno.
Á noite, no quarto de engommar, a minha criada Gervasia sentou-me no chão, embrulhado n’um saiote. De quando em quando, rangiam no corredor as botas do João, guarda da alfandega, que andava a defumar com alfazema. A cozinheira trouxe-me uma fatia de pão de ló. Adormeci: e