A CIDADE E AS SERRAS

bojuda infusa verde — um vinho fresco, esperto, seivoso, e tendo mais alma, entrando mais na alma, que muito poema ou livro santo. Mirando, à vela de sebo, o copo grosso que ele orlava de leve espuma rósea, o meu Príncipe, com um resplendor de optimismo na face, citou Virgílio:

Quo te carmina dicam, Rethica? Quem dignamente te cantará, vinho amável destas serras ?

Eu, que não gosto que me avantagem em saber clássico, espanejei logo também o meu Virgílio, louvando as doçuras da vida rural:

Hanc olim veteres vitam coluere Sabini... Assim viveram os velhos Sabinos. Assim Rómulo e Remo... Assim cresceu a valente Etrúria. Assim Roma se tornou a maravilha do mundo!

E imóvel, com a mão agarrada à infusa, o Melchior arregalava para nós os olhos em infinito assombro e religiosa reverência.


Ah! Jantámos deliciosissimamente, sob os auspícios do Melchior — que ainda depois, próvido e tutelar, nos forneceu o tabaco. E, como ante nós se alongava uma noite de monte, voltámos para as janelas desvidraçadas, na sala imensa, a contemplar o sumptuoso céu de Verão. Filosofámos então com pachorra e facúndia.

Na Cidade (como notou Jacinto) nunca se olham, nem lembram os astros — por causa dos candeeiros de gás ou dos globos de electricidade que os ofuscam. Por isso (como eu notei) nunca se entra nessa comunhão com o Universo que é a única glória e única consolação da Vida. Mas na

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