A CIDADE E AS SERRAS

Tudo é vaidade e aflição de espírito! nada existe estável sob o Sol! Com efeito, meu bom Salomão, tudo passa — principalmente o poder de usar trezentas concubinas! Mas que se restitua a esse velho sultão asiático, besuntado de Literatura, a sua virilidade, — e onde se sumirá o lamento do Ecclesiastes? Então voltará, em segunda e triunfal edição, o êxtase do Livro dos Cantares!...

Assim discursava o meu amigo no nocturno silêncio de Tormes. Creio que ainda estabeleceu sobre o Pessimismo outras coisas joviais, profundas ou elegantes; — mas eu adormecera, beatificamente envolto em Optimismo e doçura.

Em breve, porém, me fez pular, escancarar as pálpebras moles, uma rija, larga, sadia e genuína risada. Era Jacinto, estirado numa cadeira, que lia o D. Quixote... Oh! bem-aventurado Príncipe! Conservara ele o agudo poder de arrancar teorias a uma espiga de milho ainda verde, e por uma clemência de Deus, que fizera reflorir o tronco seco, recuperara o dom divino de rir, com as facécias de Sancho!

Aproveitando a minha companhia, as duas semanas de bucólica ociosidade que eu lhe concedera, o meu Jacinto preparou então a cerimónia tão falada, tão meditada, a trasladação dos ossos dos velhos Jacintos — dos «respeitáveis ossos» como murmurava, cumprimentando, o bom Silvério, o procurador, nessa manhã de sexta-feira, em que almoçava connosco, metido num espantoso jaquetão de veludilho amarelo debruado de seda azul! A cerimónia, de resto, reclamava

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