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de serra e vale, cheias de ermo e mudez, tão doces para nelas se curtirem deliciosamente as saudades do Céu; nem as espessuras de bosque, onde S. Bernardo se embrenhava, por nelas encontrar, melhor que na sua cela, a «fecunda solidão»; nem os claros de pinheiral gemente, com rochas nuas, tão próprias para a choça e para a cruz do eremita... Não! Aqui, em torno do pátio (onde a água da fonte todavia corre dos pés da cruz), são sólidas tulhas para o grão, fofos eidos em que o gado medra, capoeiras abarrotadas de capões e de perus reverendos. Adiante é a horta viçosa, cheirosa, suculenta, bastante a fartar as panelas todas de uma aldeia, mais enfeitada que um jardim, com ruas que as tiras de morangal orlam e perfumam, e as latadas ensombram, copadas de parra densa. Depois a eira de granito, limpa e alisada, rijamente construída para longos séculos de colheitas, com o seu espigueiro ao lado, bem fendilhado, bem arejado, tão largo que os pardais voam dentro como num pedaço de céu. E por fim, ondulando ricamente até às colinas macias, os campos de milho e de centeio, o vinhedo baixo, os olivais, os relvados, o linho sobre os regatos, o mato florido para os gados... S. Francisco de Assis e S. Bruno abominariam este retiro de frades e fugiriam dele, escandalizados, como de um pecado vivo.

A casa dentro oferece o mesmo bom conchego temporal. As celas espaçosas, de tectos apainelados, abrem para as terras semeadas, e recebem delas, através da vidraçaria cheia de sol, a perene sensação