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das lamas do mundo, pensamento que não pudesse contar a um santo

Verdadeiramente estas tardes santificam. O mundo recua para muito longe, para além dos pinhais e das colinas, como uma miséria esquecida:—e estamos então realmente na felicidade de um convento, sem regras e sem abade, feito só da religiosidade natural que nos envolve, tão própria à oração que não tem palavras, e que é por isso a mais bem compreendida por Deus.

Depois escurece, já há pirilampos nas sebes. Vênus, pequenina, cintila no alto. A sala, em cima, está cheia de livros, dos livros fechados no tempo dos Crúzios—porque só desde que não pertence a uma ordem espiritual, é que esta casa se espiritualizou . E o dia na quinta finda com uma lenta e quieta palestra sobre ideias e letras, enquanto na guitarra ao lado geme algum dos fados de Portugal, longo em saudades e em ais, e a Lua, ao fundo da varanda, uma Lua vermelha e cheia, surde, como a escutar, por detrás dos negros montes.

Deus nobis haec otia fecit in umbra Lusitaniae pulcherrimae... Mau latim—grata verdade

Seu grato e mau afilhado.—