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as manhãs de caça, e rumas de livros para as sestas de estudo e de calma, quando lentamente se navega à sirga. Depois, durante momentos, no convés, contemplamos silenciosamente aquelas margens que, através das compridas idades, têm feito o enlevo de todos os homens, por todos sentirem que nelas a vida é cheia de bens maiores e de doçura suprema. Quantos, desde os rudes Pastores que arrasaram Tanis, aqui pararam como nós, alongando para estas águas, para estes céus, olhos cobiçosos, extáticos ou saudosos: Reis de Judá, Reis de Assíria, Reis da Pérsia; os Ptolemeus magníficos; Prefeitos de Roma e Prefeitos de Bizâncio; Amrou enviado de Maomé, S. Luís enviado de Cristo; Alexandre o Grande sonhando o império do Oriente; Bonaparte retomando o imenso sonho; e ainda os que vieram só para contar da terra adorável, desde o loquaz Heródoto até ao primeiro Romântico, o homem pálido de grande pose que disse as dores de «René»! Bem conhecida é ela, a paisagem divina e sem igual. O Nilo corre, paternal e fecundo. Para além verdejam, sob o voo das pombas, os jardins e os pomares de Rhodah. Mais longe as palmeiras de Giseh, finas e como de bronze sobre o ouro da tarde, abrigam aldeias que têm a simplicidade de ninhos. À orla do deserto, erguem-se, no orgulho da sua eternidade, as três Pirâmides. Apenas isto — e para sempre a alma fica presa e lembrando, e para viver nesta suavidade e nesta beleza os povos travam entre si longas guerras.