28
A ESCRAVA ISAURA

coubesse em sorte uma linda e excellente mulher, elle não se havia casado por amor, sentimento esse, a que seo coração até ali parecia absolutamente estranho. Casára-se por especulação, e como sua mulher era moça e bonita, sentira apenas por ella essa paixão, que se ceva no gozo dos prazeres sensuaes, e com elles se extingue. Estava reservado á infeliz Isaura fazer vibrar profunda e violentamente naquelle coração libertino as fibras, que ainda não estavão de todo estragadas pelo attrito da devassidão. Concebeo por ella o mais cego e violento amor, que de dia em dia ia crescendo na razão directa dos serios e poderosos obstaculos, que encontrava, obstaculos, a que não estava affeito, e que em vão se esforçava para superar. Mas nem por isso desistia de sua tresloucada empreza, por que em fim de contas, — pensava elle, — Isaura era propriedade sua, e quando nenhum outro meio fosse efficaz, restava-lhe o emprego da violencia. Leoncio era um digno herdeiro de todos os máos instinctos e da brutal devassidão do commendador.

Pelo caminho, como sua mente andava sempre cheia da imagem de Isaura, Leoncio conversára longamente com seo cunhado a respeito della, exaltando-lhe a belleza, e deixando transluzir com revoltante cynismo as lascivas intenções, que abrigava no coração. Esta conversação não agradava muito a Henrique, que ás vezes córava de