novo, e na grama molhada faziam correrias uns cachorros vadios. Tocou a matinas e a tia Joana benzeu-se. Ruth, pouco afeita a madrugadas, achava um prazer divino em ir assim rompendo as névoas com a pele refrescada pela umidade da atmosfera e os olhos cheios daquela luz branca, suave, que subia e se ia estendendo pelo céu todo.
Na igreja, a tia fez reverência a todos os altares, com uma oraçãozinha na ponta da língua para cada um; Ruth seguiu até o altar-mor e ao ajoelhar-se sentiu como nunca que havia na sua alma uma súplica, um apelo para a misericórdia de Deus. Entre o altar, onde um ramo de flores esquecidas se ia desfolhando, e os seus olhos sonhadores, foi-se esboçando pouco a pouco a figura angulosa e tosca da Sancha. De mãos postas, Ruth pediu à Virgem uma bênção para a negra, um pouco de piedade, um refúgio, uma consolação. Até ali que sabia das misérias do mundo? nada. Aquela noite do Castelo, tão simples, tão monótona, fora uma revelação! Era bem certo que a lágrima existia, que irrompiam soluços de peitos oprimidos, que para alguém os dias não tinham cor nem a noite tinha estrelas! Ela, criada entre beijos, no aroma dos seus jardins, com as vontades satisfeitas, o leito fofo, a mesa delicada, sentira sempre