Havia em casa uma certa piedade pelas suas manias, um respeito pela inocência daqueles ideais. D. Elisa dizia às vezes que se a alma, no seu último vôo, tomasse forma visível, veriam, os que assistissem à morte do marido, que a dele lhe voaria do peito como uma borboleta. E toda azul! acrescentava ela, com o seu sorriso simpático.
D. Joana mal entendia as descrições do dr. Maria, mastigando com dificuldade a carne um pouco dura, batida à pressa. Ruth abria os ouvidos e via esgarçar-se a neblina que a idade punha nos olhos do médico e ir-lhe aparecendo nas pupilas azuis um branco fulgor de primavera. Ela percebia alguma coisa, via já o balão cindindo as nuvens, leve, leve, airoso, vestido de cores luminosas. Como seria bom subir tão alto, tão alto!
— O meu balão será de alumínio, um metal levíssimo, explicava ele, e todo redondo, girará em grandes círculos, como se dançasse uma valsa; percebem?
D. Joana fez que sim com a cabeça, e espetou uma batata. Ruth murmurou:
— Assim branco e redondo, será como a lua... que bonito!
Felizmente, uma nova visita veio interromper a exposição do velho, que se despediu das