estridulamente. Os bondes vinham cheios, e bandos de crianças passavam nas calçadas a caminho do colégio.
Francisco Teodoro é que não caminhava bem: tinha um grande peso derrubando-lhe os ombros, e sentia as pernas amolecidas. Tomou o bonde já na praia. Adiante dele, no banco da frente, ia um portuguezinho recém-chegado, de jaqueta, chapéu de feltro de abas ensebadas e grossos sapatos enlameados. O pequeno volvia para tudo um olhar pasmado, entreabrindo os lábios secos e gretados numa expressão admirativa. Francisco Teodoro não podia desprender a vista daquela criança rústica. Veio-lhe à memória o seu desembarque, a sua pobreza, a crosta da terra pátria que trazia presa às solas brutas dos seus sapatos, e o espanto com que ele, também, nos seus primeiros dias, olhava para este céu, e estas árvores, e estas montanhas, em uma interrogação de esperança e de medo; e da saudade que tivera da broa, da aldeia, das águas claras daquele rio em que se banhava nas tardes de verão, daquelas charnecas onde ia à caça dos grilos, daqueles campos de trigos dourados ao sol, das cerejeiras onde trepava, dos ralhos da mãe, das caminhadas pelas brancas estradas atrás dos burricos do moleiro...