60
A ILUSTRE CASA DE RAMIRES

ponte da Portella, onde os campos se alargam, e da estrada se avista Villa-Clara, que a lua branqueava toda, desde o convento de Santa Thereza, rente ao Chafariz, até ao muro novo do cemiterio, no alto, com os seus finos cyprestes. Para o fundo do valle, clara tambem no luar, era a egrejinha de Craquêde, Santa Maria de Craquêde, resto do antigo Mosteiro em que ainda jaziam, nos seus rudes tumulos de granito, as grandes ossadas dos Ramires Affonsinos. Sob o arco, docemente, o riacho lento, arrastando entre os seixos, sussurrava na sombra. E Videirinha, enlevado n’aquelle silencio e suavidade saudosa, cantava, n’um gemer surdo de bordões:

 

Baldadas são tuas queixas,
Escusados são teus ais,
Que é como se eu morto fôra.
E não me verás nunca mais!...

 

E Gonçalo retomára as suas recordações, repassava tristezas que depois cahiram sobre a Torre. Vicente Ramires morrera n’uma tarde d’Agosto, sem soffrimento, estendido na sua poltrona á varanda, com os olhos cravados na velha Torre, murmurando para o padre Soeiro: — «Quantos Ramires verá ella ainda, n’esta casa, e á sua sombra?...» Todas essas ferias as consumiu Gonçalo no escuro cartorio, desajudado