na manhã seguinte devia partir com o pae para Lisboa.
Que amarguras as d’estas ultimas horas! que intensas saudades não se amontoam no coração das creanças ao expirar o termo d’esse feliz espaço de tempo, que viveram para os carinhos da familia e para os folguedos despreoccupados!
Percebe-se em nós mesmos aquella imminencia de lágrimas, que á menor palavra rebentam.
Quem não terá recordações de infancia a falar-lhe d’isto?
O pateo despovoára-se de gente; através das vidraças da casa viam-se já brilhar as luzes interiores. Com o olhar fito no chão, a cabeça inclinada, Angelo permanecia immovel. Cortejavam-o, ao passar, homens e mulheres, sem que elle désse por isso.
De repente voltou-se, porque ouviu atraz de si uns passos conhecidos. Era Ermelinda, que voltava para casa. O pae ficára atraz a pôr em ordem as roupas e maïs objectos que serviram no auto.
—Esperava por ti, Ermelinda, para te dizer adeus—disse Angelo.
—Então vae-se embora?
—Vou ámanhã—respondeu Angelo, com a voz presa de commoção.
—Muito cêdo?
—De madrugada.
Os dois calaram-se por algum tempo, olhando para o lado.
—E agora quando volta?
—Eu sei lá? agora... só para agosto.
Novo silencio.
—Então... adeus...
—Adeus, Ermelinda.
E com a voz quasi sumida e os olhos ennevoados de lágrimas, Angelo estreitou contra o peito aquella que de pequena tratára como irmã, e que chorava ainda maïs do que elle.
Que melancólico fim de dia tão alegre!