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Contava-se como o compadre de Fulano dissera isto e aquillo ao sobrinho de Sicrano, e como tal individuo fizera e acontecera; e como tal disse que havia de fazer, e não fez; e como aquelle nem disse nem fez; e como aquell’outro dissera e fizera, e assim por deante. Um dos mais maltratados era o sr. Joãozinho das Perdizes. Dizia o auctor da correspondencia que o morgado se tinha vendido por vinho; que exercera pressão sobre os eleitores da sua freguezia; que era homem de pessimos costumes e moral depravada; jogador, bulhento, beberrão cheio de dividas, amigo de malfeitores, et coetera.

O conselheiro e Henrique seguiam a leitura com gargalhadas.

O communicado passava depois a occupar-se com o mestre Pertunhas.

O brazileiro não lhe perdoára a pressa com que este celebrára a victoria do conselheiro, á frente da philarmonica que regia.

Por vingança chamava-lhe todos os nomes injuriosos, que a raiva lhe suggeria, inclusivé o de estafador de trompa, e fechava por estas memoraveis palavras:

«Para levar á evidencia o caracter infame e intriguista d’este sevandija, basta que diga que foi elle que, poucos dias antes, subtrahiu de uma pasta aquella celebre carta politica, que tanto deu que falar no paiz. E este homem exerce o cargo de administrador do correio. Proh pudor!»

Como o leitor imagina, esta parte da correspondencia produziu sensação no auditorio.

Logo que Henrique concluiu a leitura, saiu de quasi todas as bôcas uma exclamação de surpresa ou de alegria.

— Como é?... como é?... — perguntou o conselheiro. — Diz que...?

— É o mysterio que se explica — respondeu Henrique. — A traição encarrega-se de a si propria se desmascarar.