e mal disfarçado despeito, ainda que em tom moderado:
— Sei que fui injusto comsigo, Augusto, e sinto-o do coração, creia. Ainda que as apparencias o culpassem, arrependo-me de não ter tido mais fôrça a minha confiança para não ceder. Peço-lhe por isso... humildemente... perdão. Iria a sua casa pedir-lh’o se não viesse aqui. Que mais quer? Acha-se com direitos a exigir mais? Será isso motivo para antevêr realisadas loucuras de rapaz?...
Augusto não o deixou continuar.
— Ouça-me, sr. conselheiro — disse elle placidamente — deante de todas as pessoas que me escutam, lealmente e sem hesitar, patentearei o meu coração. É verdade que essas loucuras se apoderaram de mim, que desde creança até hoje, tenho sido todo d’ellas; mas que importam aos outros, se eu commigo as guardava? se nunca por ellas regulei os actos da minha vida? Occorrencias imprevistas me arrancaram este segredo, que eu fiz sempre por suffocar. Nem ambições me despertou, como meio de realisal-o, porque nem eu realisal-o pensava. Resignar-me-hia a morrer com elle, sem o revelar a ninguem; mas adivinhado por quem o fizera nascer, e, deixe-se-me o orgulho de o dizer, adivinhado e correspondido, que muito era que me tomasse a vertigem, e que eu por momentos me deixasse cegar pelo fulgor de imprevistas esperanças? Perdôe-se-me a fraqueza. As illusões duraram pouco; as palavras de v. ex.a dissiparam-n’as... um tanto cruelmente, mas em todo o caso acordei. Creia, sr. conselheiro, que o ser pobre, sem familia e sem nome, impõe tambem uma certa ordem de deveres, a que eu serei fiel. Não é o de humilhar-me, é o de manter a unica dignidade que me resta, a dignidade moral. Já vê v. ex.a que se enganou de duas maneiras: nem da parte do rapaz pobre houve especulação, nem da parte da herdeira rica estouvamento.
E, acabando de dizer estas palavras, Augusto inclinou-se